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sábado, 5 de março de 2022

Uma esperança para os nerds da geração Y

                   





   Chamada de covarde por algumas pessoas das gerações anteriores e de vergonhosa ou "cringe" pelas gerações atuais ou mais modernas, a geração Y (nascidos entre 1981 e 1995) tem virtudes que ninguém conhece e é vítima do excesso de promessas que as gerações anteriores jogaram sobre ela. Eu nasci em 1992 e, nesse texto, contarei a minha percepção sobre a minha geração!

 Nem covarde, nem vergonhosa: a geração Y teve a coragem de ultrapassar velhos padrões, criar um mundo com mais empatia, romper preconceitos, trazer valores humanitários às pesquisas acadêmicas, trazer a saúde psicológica para o palco da vida, expandir as filosofias espirituais mais profundas, transformar o ambiente de trabalho a partir de motivações mais morais e menos patrimonialistas e foi a última geração que viveu momentos de transição realmente emocionantes na cultura além de presenciar as últimas produções artísticas e musicais com qualidade genuína. 

  A "dor de cotovelo" das gerações atuais por não terem vivido a magia que vivemos na cultura faz com que elas cometam "bullying" conosco, apelidando de "cringe" (vergonhoso) todos os elementos que, no fundo, elas invejam para ocultar a vergonha que sentem do próprio tempo (e nem precisa ser formado em Psicologia para perceber esse comportamento reverso -- todo bullying esconde a insegurança e a inveja de quem comete, pois é o ato de quem tenta humilhar psicologicamente aquele que ele considera superior para cobrir as próprias feridas de sensação de inferioridade e as próprias inseguranças de viver uma geração sem muita identidade cultural e sem elementos muito graciosos como hoje). 

  Em verdade, "cringe" mesmo é esse bullying sem sentido, porque toda pessoa inteligente e que estuda história sabe que nenhuma geração pode ser considerada superior a outra. Os sentimentos humanos sempre foram os mesmos apesar das evoluções tecnológicas. 


                




 Sem as gerações passadas, não estaríamos aqui hoje. Respeitar os antepassados é um sinal de civilização e educação. Ser humano é sempre ser humano independente do tempo em que vive (a não ser que a próxima geração seja feita de robôs). Absolutamente, toda geração tem um lado bom e um lado ruim. Mudamos a "roupagem", mas compartilhamos da mesma essência e dignidade humana. 

  É verdade que ainda não saímos da casa dos pais. É verdade que não temos filhos. É verdade que estamos chegando aos 30 sem o sucesso esperado e sem independência. 

 Covardia? Elementos vergonhosos da nossa geração? Não. Simplesmente, fomos vítimas do excesso de teoria do sistema educacional e profissional que fecha as portas para quem não tem mestrado e forma profissionais que não sabem lidar com a prática em faculdades excessivamente teóricas.


         








  No tempo do meu avô, era possível ter uma boa profissão e até enriquecer sem ter o Ensino Médio completo. As pessoas se casavam aos 18 anos, e o casamento durava até a morte. A vida parecia mais fácil para fluir, mas também era mais tediosa e sem espaço para projetos pessoais, expressões criativas e questionamentos mais filosóficos. 

  Quem se destacava em manifestações criativas era alguém considerado "gênio" ou "ponto fora da curva". Já a nossa geração atual cresceu escutando que é bonito ser o "gênio diferente" e que deve expressar a própria personalidade para brilhar (escutamos isso nas aulas do colégio e nas palestras sobre grandes personalidades, e essas ideias ficaram em nosso subconsciente). A cultura pedagógica da nossa educação incentivou certo egocentrismo e esqueceu de nos dar praticidade. Hoje, o que mais ouvimos falar é que a criatividade e a interdisciplinaridade são os dois maiores elementos de crescimento no mundo profissional. 

  Antigamente, as pessoas só queriam se casar, trabalhar e ter uma vida normal. Hoje em dia, buscamos a tal da "felicidade" pessoal, da realização individual, e vivemos num mundo cheio de coaches, estímulos midiáticos, sensações depressivas e remédios psiquiátricos por causa da pressão que existe em busca do sucesso individual e da felicidade plena. Ocorre que a felicidade para surgir tem que ser natural e de dentro para fora, pois a pressão sobre ela é que gera infelicidade. 


  


             

  Essa exaltação à educação e à realização pessoal do mundo de hoje não deixa de ser bonita (e eu sou uma das maiores defensoras da cultura, da educação e de uma saudável autoestima misturada com realização pessoal sem perder a caridade), mas esqueceu de formar pessoas práticas e sábias. 

  Além do mais, conhecimento cultural não tem nada a ver com sabedoria. Há pessoas ignorantes do ponto de vista espiritual ou da inteligência emocional com diplomas na mão hoje em dia. Formamos uma geração muito culta e pouco prática. Esqueceram de valorizar a sabedoria e a inteligência emocional na educação (um autor que critica esse fato e defende muito a propagação de ferramentas de inteligência emocional nas escolas é o psiquiatra Augusto Cury), e nos deram muitas ferramentas teóricas de conhecimento jamais vistas em gerações passadas -- só que sem a parte prática. 

  Se, antes do nosso tempo, o trabalho, o casamento e a vida prática estavam no topo da pirâmide de valores das pessoas e eram as principais buscas delas, hoje tudo isso está sendo adiado em prol da realização pessoal que tanto propagaram para a nossa geração. 


          


  Diziam para nós que a nossa geração estava destinado a um futuro brilhante por causa da qualidade teórica da nossa educação, algo jamais visto em gerações passadas. Quem foi nerd no tempo da escola levantou a bandeira dos estudos como a luz do futuro. No tempo da escola, quem foi estudioso sonhou que teria palco para o seu conhecimento e muito sucesso um dia. O mundo dos estudos tinha um brilho especial. 

 Ocorre que, ao mergulhar no caminho dos estudos, não encontramos o sucesso imediato na vida adulta após a faculdade. Apenas encontramos mais teorias e um caminho acadêmico sem fim, com especialização, mestrado e doutorado. 

  Nós, os nerds da geração Y, sacrificamos a vida pessoal, a vida romântica, os prazeres da vida em função dos estudos, não é verdade? E nem foi por causa de pressão familiar, pois nossos pais da geração X sempre foram muito tranquilos conosco e dialogavam conosco com mais carinho que os familiares das gerações passadas (nossos avós foram rígidos com nossos pais, mas nossos pais foram carinhosos conosco). 

 E valeu a pena o sacrifício? Hoje, vemos pessoas que nem se dedicaram tanto aos estudos tendo uma estabilidade profissional na vida prática, casadas e com filhos, enquanto nós estamos perdidos no meio do excesso de teorias que mergulhamos. 

 Para o nerd da geração Y que está na melancolia diante da dúvida se valeu a pena estudar, eu digo com esperança: valeu a pena. Mesmo que as coisas demorem mais na vida de quem é estudioso, nossa qualificação nos tornou pessoas melhores, mais sábias, mais admiradas no meio acadêmico e com mais oportunidades no meio profissional. Tudo serviu para o nosso processo de amadurecimento educacional, profissional e até pessoal. 

  Se você quis apenas fama com os estudos, você pode até se lamentar. Mas, se você se sacrificou realmente por amor à jornada de estudos e qualificação profissional, você verá que, mesmo sem o sucesso imediato e sem o tal do "futuro hiper-ultra-mega brilhante" que acreditávamos enquanto estudantes, os estudos acenderam uma luz na nossa alma: a luz da liberdade intelectual. E essa luz não tem preço. Somos a geração com a maior liberdade de pensamento e expressão de todos os tempos: e essa é uma conquista nossa. 


               


  Eu creio que um dia os nossos estudos darão frutos. Assim como o vinho melhora quando fica mais velho, o sucesso é mais feliz quando chega mais tarde, Certamente, os frutos da nossa liberdade intelectual serão mais doces. 

    Não se revolte com quem fez fama com conteúdo supérfluo e sem qualidade cultural: tudo o que vem fácil, um dia, pode ir embora rapidamente. Fama em rede social não é porto seguro de ninguém. Não se compare com quem fez sucesso cedo, visto que muitas crianças famosas e jovens famosos têm o brilho ceifado na vida adulta, e a imaturidade já fez muita gente estragar o próprio legado. 

   Vamos continuar regando com paciência e sem expectativa cada semente dos nossos estudos, pois um dia a geração Y vai brilhar, nem que seja com os cabelos brancos. Nosso legado será maduro e bonito. E cringe será aquele que duvidou de nós. 

   Mas, enquanto o seu futuro hiper-ultra-mega-power brilhante não chega do jeito que você espera, seja feliz no momento presente, equilibrando momentos de estudo com momentos de prazer e lazer. 

  Talvez todas as provações psicológicas da nossa geração vieram nos ensinar a ter o exato equilíbrio na vida. A vida romântica e o prazer fazem parte da vida e podem ser o nosso porto seguro, o equilíbrio e o colorido do nosso futuro sucesso profissional. 

  Construir uma vida pessoal também vai nos ajudar muito além do equilíbrio entre estudar e viver: é o que nos dará mais esperteza na vida prática, fazendo uma ponte entre teoria e praticidade. 


Texto escrito por Tatyana Casarino. Especialista em Direito Constitucional, advogada, escritora e poetisa. 

terça-feira, 14 de julho de 2020

TPM: A professora da mulher para novos significados de autoestima.


  TPM: A professora da mulher para novos significados de autoestima. 

Olá, pessoal! Esse é mais um texto sobre Sagrado Feminino que escrevo aqui no blogue. Boa leitura!

                   


   Os nossos defeitos, no período menstrual, afloram em grandes dimensões. Sentimos culpa pelo estresse incompreensível e pelos ataques de descontrole emocional que surgem com mais frequência na Tensão Pré-Menstrual (TPM). Umas mulheres colocam toda a culpa na TPM e outras puxam toda a culpa para si mesmas, mas nenhum dos dois caminhos é saudável. Será que existe um caminho equilibrado onde admito a responsabilidade diante das minhas atitudes na TPM, evoluo com consciência e, ao mesmo tempo, pratico a autocompaixão tão necessária nesse período? 
   Culpar a TPM e não olhar para a própria responsabilidade seria um equívoco infantil, mas puxar toda a culpa para si (detonando a própria autoestima) não conserta os nossos erros. A culpa leva ao desespero emocional e o desespero somente atrai mais erros. A única maneira de corrigir verdadeiramente os nossos erros é aceitar os nossos defeitos, amar as nossas imperfeições e ter a consciência de que estaremos à flor da pele na TPM. Somente teremos força e energia para corrigir os nossos erros com o amor-próprio, a autocompaixão e a luz da consciência. A culpa e o desespero apenas sugam as nossas energias, impedindo a alma de mudar e levando a mulher a cometer mais erros em um círculo vicioso.  
      Em verdade, a mulher fica mais conectada com o mundo espiritual na TPM e mais vulnerável aos ataques psíquicos e espirituais. Por isso, é preciso redobrar a vigilância e a oração. Quase todo equívoco cometido na TPM é decorrência da falta da devida vigilância ou da oração que harmoniza a alma. Não é à toa que a alma da mulher é mais inclinada ao místico do que a alma cética dos homens -- as mulheres sabem que precisam rezar mais, porque o céu e o inferno disputam a sua presença mais ardentemente desde Eva. 

             

       

             Não podemos culpar as mulheres se elas ficam irritadas, sérias e tristes na TPM. Imagina só, em uma hipótese absurda e em um mundo paralelo, se meninos engraçados menstruassem? Teríamos uma série de condutas obscenas, episódios de humor sádico, gracinhas mal-educadas com o sangue e a banalização desse período sagrado. A menstruação não combina com o masculino nem mesmo com o bom humor e a alegria. É preciso ser feminina, séria, brava e melancólica para passar por esse período. 
        Não amaldiçoemos a TPM. Ela não é nossa loucura, mas nosso discernimento. Deus é perfeito. Deus criou a natureza da mulher propensa a ficar brava e triste antes de menstruar para não banalizar o aspecto sagrado desse período. Deus foi perfeito quando criou as peculiaridades psicológicas da mulher para harmonizar as suas potências biológicas. Loucura não é ficar triste na TPM sem motivo aparente. Loucura seria sangrar (ou estar prestes a sangrar) rindo a achando graça. A tristeza e o recolhimento do período menstrual são discernimento. 
           Nosso corpo se preparou para receber um bebê. Na ausência de um bebê, sangramos a potência da vida. Mesmo quando não geramos um filho, geramos vida nova dentro de nós todos os meses. Sangrar na menstruação é purificar a velha vida do mês passado e ficar nova para o próximo mês. 
             Mesmo quando não geramos um filho, geramos uma vida nova -- ainda que seja uma vida nova para nós mesmas. A mulher está sempre nascendo de novo. Diante disso, é completamente natural receber uma nova vida com nervosismo e choro. Se, ao sangrarmos, estamos recebendo nova vida, é natural ficarmos tensas antes da vida nova chegar. Um bebê, quando nasce, não chega sorrindo para a vida -- ele chora, fica nervoso, sente dor ao respirar pela primeira vez e sente saudade do útero materno. 
             O choro faz parte da nossa essência mais primitiva. Quando estamos diante de um novo ciclo, ainda que seja um ciclo bom, a vida nova causará nervosismo. Pode parecer incompreensível, mas, antes de receber nova vida, é completamento natural chorar. A mulher vive mais que os homens estaticamente. Motivos científicos devem explicar isso, mas espiritualmente a renovação das potências de vida dentro de uma mulher são mais fortes -- e isso poderia explicar a nossa longevidade inclusive. 

                             

               

               A tristeza não é um estado mau em si. A tristeza na TPM pode ser discernimento. Quem rotulou a tristeza como um mau sentimento foi a nossa sociedade ocidental. A nossa sociedade ocidental é a que mais recrimina a tristeza e, no entanto, é a mais depressiva -- eis a hipocrisia da nossa sociedade. A sociedade vende drogas lícitas, ilícitas, remédios psiquiátricos e outros falsos bálsamos para abafar a tristeza quando, em verdade, deveríamos abraçar a tristeza. Somente através da aceitação da tristeza é que podemos alcançar a verdadeira felicidade. A pessoa verdadeiramente madura emocionalmente é a que sabe lidar de maneira sábia com os seus sentimentos ruins e não aquela que se força a estar bem o tempo todo. 
             Além do mais, a verdadeira felicidade da alma não é a ausência da tristeza nem um contentamento eterno formado por uma alegria perene (esse tipo de estado de contentamento não existe), mas a estabilidade do amor-próprio diante das nossas falhas e vulnerabilidades. Se é possível ser feliz na TPM? Talvez não seja o período mais alegre do mês, porque ficaremos amuadas, melancólicas, irritadas e mais vulneráveis. Mas, se ao invés de cairmos em cobranças perfeccionistas típicas de nosso lado crítico feminino e abraçarmos a nossa sombra feminina e a nossa vulnerabilidade, é possível ter uma TPM mais confortável, lúcida, criativa, sábia e até mesmo mais emocionante positivamente.  
                  A aceitação da nossa vulnerabilidade e da nossa sensibilidade talvez seja a nossa verdadeira força. Pode ser que nossa maior força não esteja na superação, mas na resignação diante do nosso lado "sombra" (o conjunto de defeitos e vulnerabilidades que fica aflorado na TPM). Todo sentimento que chega até nós não é bom ou mau em si -- todo sentimento é simplesmente um mensageiro. Os sintomas da TPM são apenas mensageiros que querem, em verdade, aumentar a nossa autoestima. Eles somente detonam a autoestima daquela mulher que fica desesperada diante deles por não saber amar a própria vulnerabilidade. Ficamos revoltadas quando pensamos que a TPM quer detonar a nossa autoestima. Contudo, se tivermos olhos mais profundos para ler a sua mensagem espiritual e psíquica, veríamos que a TPM quer aumentar o nosso amor-próprio. 

                            

                

              Vocês já pararam para pensar na mensagem que a TPM quer levar até a mulher? Se a TPM pudesse contar em palavras para você o que ela quer, ela diria: "Mulher, tire um tempo só para você, coloque a sua alma em primeiro lugar, abrace os seus defeitos, faça as pazes com a sua vulnerabilidade, recupere o seu poder pessoal e aceite que você não é perfeita. Ame as suas imperfeições e o seu lado sombra, porque eles também fazem parte de você". Talvez esse bilhete viesse com a assinatura de Lilith (risos), a lua negra, o arquétipo da deusa sombria do inconsciente feminino. 
            Mas, a maioria das mulheres não percebe a profundidade da mensagem por trás da TPM. A maioria não sabe que ficar mais irritada com as pessoas que costumam despertar a sua generosidade significa que a irritação apenas quer que a mulher aprenda a ter um tempo só para si. Cuidar de si mesma não é egoísmo, mas o verdadeiro bálsamo de qualquer cura emocional. A mulher é naturalmente mais generosa, mais cuidadosa com todos, mais maternal com todos e acaba se esquecendo de cuidar de si mesma. Se ela adota uma postura de esquecimento dos próprios instintos, os instintos gritarão com ela mesma sob a forma da ira, da irritação e da angústia. Às vezes, precisamos explodir emocionalmente para lembrarmos que precisamos dar atenção aos nossos instintos e às emoções da nossa alma. 
              E a mensagem mais sábia da TPM talvez seja fazer a mulher olhar para os próprios defeitos. Costumamos passar o mês colocando aquilo que nos incomoda para debaixo do tapete. Na TPM, é a hora de vermos a sujeira debaixo do tapete. Se fôssemos mais francas com aquilo que nos incomoda, talvez não tivéssemos tanto sofrimento na TPM. Mas como costumamos negligenciar a nós mesmas para agradar os outros, precisamos sentir irritação e tristeza para darmos atenção a nós mesmas. Os maus sentimentos são apenas mensageiros da necessidade de autoconhecimento, descanso emocional e amor-próprio. 
              A mulher tende a ser perfeccionista -- ela precisa se sentir bonita por fora, pacífica por dentro, agradar as pessoas, ser produtiva e fazer tudo certinho para sentir-se bem. Ocorre que não somos perfeitas. A necessidade de abraçar a imperfeição vem sob a forma de TPM. É preciso ressignificar a autoestima na TPM. A autoestima não é sobre sentir-se linda e maravilhosa todos os dias como os coaches vendem por aí -- ninguém se sente assim todos os dias. Autoestima é amar a nós mesmas com os nossos defeitos. A autoestima é achar charmosa uma cicatriz. A autoestima é consolar a si mesma quando tudo der errado. A autoestima é pensar positivo de si mesma e estar do próprio lado em seus piores dias. A autoestima está presente quando rimos das nossas falhas. 
                  Em especial, ter autoestima significa abraçar a si mesma e estar do próprio lado em todas as situações. É saber dar valor para a própria visão de mundo ainda que tenhamos respeito e empatia pelas visões e modos de viver dos outros. É saber construir as próprias convicções e falar a partir do que a própria alma sente. Autoestima é abraçar a si mesma após uma falha ao invés de se recriminar. E é provável que falharemos mais na TPM. A autoestima vem para transformar culpa em responsabilidade, corrigindo as nossas falhas com boas obras. 
                Salienta-se que a culpa teria a função nobre de corrigir falhas, porém não é isso que ela faz. A culpa acabou virando um sentimento masoquista e sufocante que detona a nossa autoestima, deprecia a nós mesmos e causa desespero na alma -- e esse desespero levará a novas falhas e novas culpas (culpa e desespero não levam a lugar algum). Para corrigir as nossas falhas, precisamos de consciência e serenidade e não de desespero. A culpa e o desespero não corrigem as falhas e acabam sendo sugadores das energias da alma. Fique com a nobre missão de corrigir as suas falhas, mas expulse a culpa de seu coração. 

                              

                

               É fácil amar as nossas virtudes. É fácil sentir-se orgulhosa após uma vitória. É fácil amar o espelho quando estamos estilosas, maquiadas e produtivas. O difícil é amar os nossos defeitos. O difícil é ter autocompaixão diante dos vícios da alma. O difícil é apoiar a si mesma após uma derrota. O difícil é amar o espelho quando estamos pálidas, com olheiras, com dores mamárias, cara lavada, cólicas, melancolia e irritação. Contudo, a maior nobreza da autoestima surge quando conseguimos estar ao nosso lado diante das nossas nossas imperfeições que gritam dentro de nós. 
                 Esteja ao seu lado. Faça um pacto consigo mesma. A autoestima é a reconciliação com a nossa própria alma, ou seja, ela é como se fosse um casamento com a nossa própria essência. No casamento, juramos amar o outro na alegria, na tristeza, na saúde e na doença. Na vida, para termos saúde emocional e maturidade espiritual, também precisamos jurar a nós mesmas que amaremos a nós mesmas na alegria, na tristeza, na saúde e na doença. 
               Não se recrimine na tristeza, não queira se castigar após uma falha e não se desespere se você sofreu uma explosão emocional na TPM. O seu pior castigo já foi a própria falha. Fique do seu lado, pois você sabe que não agiu por mal. Mas isso não significar que você "lavará as mãos" diante das falhas e colocará toda a culpa na TPM. Estar do seu próprio lado significa que você não vai desistir da vida nem desistir de si mesma por causa dos maus sentimentos que a TPM provoca em você. Estar ao próprio lado significa encarar humildemente que você é uma eterna aprendiz e que é possível corrigir as suas falhas com boas obras futuras e mais sabedoria e vigilância da próxima vez. Estar ao próprio lado significa perdoar a si mesma por suas imperfeições e continuar sentindo que merece a felicidade e a evolução espiritual. 
                O maior conselho que eu poderia dar para você, cara leitora, seria o seguinte: ame os seus defeitos. Sei que parece um conselho louco e impossível, mas ele pode ser vivido e tem poder transformador. É difícil amar os nossos defeitos, mas eles somente serão transformados de verdade a partir do amor e não da culpa. O amor tem um poder transformador extremamente produtivo na alma enquanto a culpa é puro masoquismo improdutivo. 

                            

                   

                    É o amor-próprio que transforma a nós mesmos e não a culpa nem a cobrança. A autoestima verdadeira é sobre estar ao nosso lado independentemente do que tenhamos feito na TPM e de quantas rasteiras tenhamos recebido das falhas do nosso temperamento aflorado nesse período. Devemos estar ao nosso lado até quando erramos e devemos aprender a defender a nós mesmas diante dos tropeços. 
               Precisamos ser mais "advogadas" de nós mesmas (não no sentido jurídico, mas no sentido emocional) e não acusadoras. Devemos ser mais consoladoras de nós mesmas e menos críticas de nós mesmas. Costumamos esperar amor e consolação dos outros quando erramos, mas será que damos amor e consolação para nós mesmas? Costumamos ter medo de críticas e sentir raiva quando os outros criticam a nossa vida e o nosso trabalho, mas será que percebemos que a nossa própria cabeça tende a criticar a nós mesmas?  As piores críticas são aquelas que a nossa própria cabeça cria contra nós. Portanto, precisamos aprender a amar a nós mesmas e consolar a nós mesmas após as nossas falhas. Precisamos ser nossos próprios advogados emocionais e não acusadores masoquistas de nós mesmos. 
                  Afirmo que precisamos ser nossos "advogados emocionais", porque sou advogada e gosto do termo (risos). No curso de Direito, aprendemos que todo cidadão tem direito à defesa -- mesmo o pior criminoso. Por que você não teria o direito à defesa diante das suas falhas, cara leitora? Saiba defender a si mesma! Certamente, as suas falhas na TPM são menores do que você pensa e não são nenhum crime. É verdade que cometemos mais erros na TPM e sentimos culpa por causa disso, mas devemos ser mais leves com a nossa alma. Devemos ser compassivas com as nossas falhas, porque somente o relaxamento emocional da autocompaixão trará a paz de espírito para mudar a nossa conduta na TPM, tirando a nossa alma do estresse e levando o nosso espírito para a luz da consciência. 
                  Precisamos aprender a conviver com os nossos defeitos e não abalar a nossa autoestima por causa deles, porque nunca seremos perfeitos. Não somos ilimitados, porque sempre teremos as nossas "deficiências" emocionais e feridas emocionais. Uma querida amiga com deficiência visual costuma dizer que a palavra "deficiência" é relativa e que todos nós temos as nossas limitações independentemente de sermos fisicamente "perfeitos" ou não. Em verdade, costumamos sentir amor e compaixão diante das pessoas com deficiência e somos mais compassivos com os defeitos dos outros enquanto esquecemos de sentir compaixão e amor pelas nossas próprias limitações, "deficiências" e imperfeições. 

                            

                   

                  Devemos ressaltar que existem questões onde seremos mais virtuosos e eficientes e outras questões que teremos dificuldades e "deficiências", mas não podemos sentir desespero por causa disso. Não seremos virtuosos em tudo. Sendo assim, aceite com amor as suas imperfeições e tenha compaixão por suas limitações. Ter compaixão não é ter pena, assim como ter autocompaixão não é ter pena de si mesmo. Ter compaixão é irradiar ternura e compreensão diante das limitações humanas. 
                      Vejo que está faltando mais compaixão pela natureza imperfeita do ser humano inclusive dentro dos círculos religiosos. A religião deveria ter ensinado sobre compaixão diante da limitação, mas, diversas vezes, falha com o seu dever em relação à compaixão. Grandes mestres religiosos vierem ao mundo ensinar sobre a compaixão, mas os religiosos continuam focando mais na "iluminação" do que na sabedoria dos erros. A religião virou um instrumento de evolução, santificação e perfeição que foge cada vez mais do erro e da limitação humana. Logo, a religião criou ainda mais culpa e tabus diante dos nossos erros. 
             Os espíritas pregam a compaixão e caridade, mas pregam mais ainda a evolução espiritual. Quando os espíritas erram, eles se sentem culpados como se estivessem falhando na sua própria "evolução". Eles não sabem que os erros são os verdadeiros professores da nossa evolução espiritual. Vejo cristãos com pavor do erro, da falha e do pecado. Vejo cristãos soberbos que se consideram "santos" e "iluminados", mas eles não se lembram que Jesus veio buscar os oprimidos e veio ensinar os pecadores e não os justos. 
           Vejo que muitos cristãos refletem mais os fariseus do que os próprios ensinamentos de Cristo, especialmente na hipocrisia soberba de seguir mais a forma do dogma do que a substância amorosa de Cristo no coração. Talvez a nossa culpa diante do erro seja fruto do orgulho, porque o erro mostra que somos humanos imperfeitos. Talvez deveríamos aprender mais com Santa Teresinha do Menino Jesus que defendia a humildade como a verdadeira chave da santidade. 

                      

             

           Através dos ensinamentos dessa santa, percebemos que a santidade não está em querer ser uma grande alma repleta de virtudes e realizações, mas na entrega absoluta da nossa vida à misericórdia de Deus. Somos, em verdade, pequenas almas imperfeitas que precisam dos cuidados de Deus para caminhar na vida. Não conseguiremos caminhar sozinhos devido às imperfeições da alma. É  a consciência da nossa imperfeição e da nossa necessidade de Deus a parte mais nobre da espiritualidade e não a virtude nem o anseio de perfeição, santidade ou "evolução espiritual". 
            Não afirmo que é errado desejar evoluir ou desejar a santidade. Apenas afirmo que a evolução não é a parte mais nobre da nossa religiosidade. A parte mais nobre da nossa religiosidade é a resignação diante de algumas imperfeições humanas, visto que a resignação gera a confiança absoluta Naquele que é o único detentor da perfeição -- Deus (essa é a nobreza da fé que precisa da nossa humildade).
             Algumas pessoas até se decepcionam com a religião quando percebem que os seus erros perturbam a sua vida de vez em quando e que não existe vida perfeita. Algumas pessoas se desiludem quando pensam em grandes transformações espirituais e grandes curas espirituais dentro das religiões. Mas é justamente na resistência e na perseverança diante dos maus momentos que a fé deveria crescer dentro de nós. Talvez a verdadeira cura não está na ausência da imperfeição, mas no encontro da forma correta de lidar com as nossas imperfeições. 
          Santa Teresinha estava certa quando afirmava que não passamos de eternas crianças (e toda criança chora, erra e faz bagunça de vez em quando) necessitadas do cuidado de Deus. Deus, como um bom Pai, não deixaria de amar o seu filho quando vê seu filho errando, mas ofereceria seu cuidado, ensinamento e misericórdia. Um bom Pai até oferece uma reprimenda, mas é sempre pelo bem do filho. E o desejo de ver o filho bem provém da misericórdia. 
             Quando sentimos as nossas limitações de forma mais intensa, esse é um verdadeiro momento de esperar por Deus. Santa Teresinha afirmava uma frase poética: "Meu pé vacila, Senhor, mas tua misericórdia é minha força". A santidade não está na perfeição, mas está em suportar com brandura nossas imperfeições como dizia Santa Teresinha. O verdadeiro segredo da santidade é a humildade diante das nossas imperfeições, pois somos almas pequeninas que necessitam da bondade de Deus. 

                                

                

               Na TPM, a mulher tende a falhar mais, a sentir com mais intensidade as próprias limitações e a ter um encontro desagradável com os seus próprios defeitos. Quando tudo isso acontecer, mulher, não se desespere. Abrace a si mesma com autocompaixão e admita com brandura as suas imperfeições. Esse é realmente um momento sagrado onde você deve se conectar com Deus. Permita que a TPM seja a sua professora para ensinar a você novos significados de autoestima. Autoestima não é sentir-se linda e maravilhosa o tempo todo, mas abraçar a si mesma com toda as suas imperfeições. Seus defeitos não tiram o brilho das suas qualidades, mas mostram que você é humana, precisa cuidar de si mesma e necessita também do cuidado de Deus. 
                A menstruação pode ser um período místico e romântico. Não estou romantizando a cólica nem a dor, mas dizendo que o período menstrual, em geral, ostenta certo charme e mistério. Um ser humano que sangra todo mês em determinada lua ostenta algum mistério -- e esse mistério é só seu, mulher. A sociedade moderna é cética, afasta o místico da existência e faz propaganda de pílulas para você. Entretanto, o caminho da sua alma está em sua intuição e não no que a sociedade moderna prega. Permita sentir o poder da alma feminina nesse período. 
              Permita que a TPM resgate o seu poder pessoal. Transforme a sua irritação em autoafirmação e defenda os seus desejos. Você também merece cuidados. Dedique um tempo só para você. Transforme a sua melancolia em sabedoria. Sinta o poder criativo que a melancolia traz à alma e canalize esse estado em arte, escrita e representações de sua intuição. Quando estamos leves e felizes, deixamos passar despercebida a sabedoria da profundidade emocional.
              A melancolia não é totalmente má, porque ela traz mais profundidade emocional para você se você observar bem o seu ritmo. A irritação também não é totalmente má, porque ela acentua em você o desejo de defender a si mesma. Você não precisa passar por esse período chorando e brigando com os outros. Se você já passou por esse período com essas falhas, perdoe-se por isso. Contudo, seja mais responsável para saber extrair pérolas da melancolia sem cair em lágrimas desnecessárias. Além do mais, saiba defender as próprias vontades de forma educada sem brigar com os outros. 
           É importante que você defenda as próprias vontades sempre para que a irritação não seja obrigada a lembrar você disso na TPM. Não seja submissa aos outros, mulher! Valorize sempre a si mesma! Saiba ser generosa com equilíbrio, ou seja, saiba exercer seu lindo lado solidário e maternal com os outros sem esquecer de agradar a si mesma também e reservar momentos para reabastecer as energias da própria alma. Se você viver de forma mais equilibrada, sua TPM também será mais amena e harmoniosa. 

                             

             

              Muitas pessoas falam que a autoestima tem a ver com beleza, especialmente para a mulher. Concordo que cuidar da aparência é ótimo e ajuda a elevar a autoestima da mulher, mas o mais importante é cuidar da nossa alma por dentro. É preciso sentir-se bela por dentro e saber ver a beleza das nossas características essenciais e da nossa sensibilidade. É preciso até mesmo abraçar o lado "feio" da nossa alma e entender que não existem flores sem espinhos. Se a alma de toda mulher é uma flor, certamente encontraremos muitos espinhos dentro de nós também. O novo significado de autoestima ensinado pela TPM tem a ver com a aceitação dos nossos espinhos. Ao aceitar os espinhos, a mulher suportará com brandura as próprias imperfeições ao invés de sentir desespero e culpa diante das sombras do período menstrual. 

                       

               

              Diante do nosso temperamento inevitavelmente aflorado durante a TPM, devemos aprender a aceitar os nossos defeitos para seguirmos a vida com autoestima. Permita que as sombras da TPM sejam transformadas em luzes de entendimento e criatividade. Canalize a sensibilidade aflorada em reflexões e eleve as suas reflexões ao invés de cair em autocobrança. 
             Se você gostou desse texto, saiba que ele foi escrito por uma mulher durante a sua TPM. E, se não fosse a minha TPM, eu não teria descoberto tantas pérolas de sabedoria para transmitir para vocês. Rubem Alves dizia que ostra feliz não faz pérola, porque é preciso ter dentro de si um grão de areia que a faça sofrer. Se a TPM parece uma pedra no seu sapato ou uma areia na sua concha, transforme esse sofrimento em pérola. É possível transformar qualquer dor em pérola e ver a beleza da flor em cada um de seus espinhos também -- basta você querer expandir a sua consciência. Expanda a sua consciência ao invés de reclamar da TPM. A reclamação estreita a sabedoria enquanto a aceitação da TPM e das nossas imperfeições expande a nossa consciência. 

Texto escrito por Tatyana Casarino.

Tatyana Casarino é Especialista em Direito Constitucional, Advogada, escritora e poetisa. 

terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

A sabedoria por trás da rejeição



  Como advogada e cidadã, fico perplexa diante das barbáries dos crimes passionais. Parecem loucuras inimagináveis as frases doentias do tipo: "Eu te odeio, mas por favor não me deixe". Homens que não são capazes de ouvir um "não" de suas namoradas ou que preferem matar a mulher a suportar o fim de um relacionamento assustam a sociedade. Mulheres que agem de forma tóxica e manipuladora quando um homem termina o relacionamento com elas são igualmente doentias. Pessoas que matam as outras em nome do "amor" geram perplexidade. Mas, em nome de qual "amor" as pessoas matam? 
    O amor não mata. É totalmente ilógico e irracional dizer que alguém matou "por amor". São as paixões que matam. Por isso, o nome desses crimes se refere à paixão e não ao amor. Crime "passional": notem que a sua expressão vem da paixão. E, quando dizemos "paixão", vamos nos aprofundar no sentido amplo dessa palavra. Não é simplesmente a "paixão" entre um homem e uma mulher ou o sentimento de estar "apaixonado". Paixão quer dizer impulso, excesso de sentimento, descontrole emocional e tudo o que é relacionado a natureza corruptível do ser humano como, por exemplo, os seus vícios. 
     Uma pessoa passional é uma pessoa que age sem pensar, que coloca as suas paixões acima da razão. Uma pessoa passional é aquela que fica "cega" quando sente ira, gula, luxúria, orgulho, inveja e etc. Passional é quem age de acordo com o seu lado "animal" e não sabe colocar "freios" em suas ações. É a pessoa "pecadora" no sentido católico do termo, porque a natureza corruptível do ser humano e com inclinações para o mal passou a existir a partir do momento que o pecado entrou no mundo.
       Podemos observar que, geralmente, os sentimentos ruins que provocam as más ações e os crimes também são considerados "pecados capitais" para a teologia católica (orgulho, ira, inveja e etc). O pecado capital leva esse nome por ser a "cabeça", ou seja, a origem de todos os outros pecados ou ações más. Esses sentimentos passionais, além de serem considerados "pecados", são altamente destrutivos quando desordenados. 


                                    
    

       Independentemente de você crer na teologia católica ou não, o fato é que esse estudo sobre o "pecado" ou sobre a nossa natureza no sentido místico pode ajudar o mundo jurídico a compreender o porquê da nossa natureza criminosa. E digo "nossa" natureza criminosa, porque todos nós temos um bandido escondido no inconsciente. A razão pela qual o noticiário sangrento fascina e vende é por extravasar o lado feio e sujo do nosso inconsciente. Quando vemos o outro ser humano cometendo coisas ruins, ficamos apavorados. Diante disso, o pavor não é somente o medo de ser vítima de um bandido qualquer, mas também o medo do que eu sou capaz de fazer enquanto ser humano. Até onde vai a maldade humana? Temos medo do nosso próprio livre-arbítrio e da possibilidade de praticar o mal. 
     Quando sentimos medo do mal, também sentimos medo da possibilidade de praticar o mal e do livre-arbítrio que foi dado para nós. Como o filósofo Sartre dizia, estamos "condenados a ser livres". A responsabilidade diante da escolha entre o bem e o mal pesa nos nossos ombros, porque não existe liberdade de escolha sem a responsabilidade das consequências -- eis o paradoxo da vida. 
       Uma prova de que temos medo de praticar o mal quando nos deparamos com o abismo da nossa natureza e com os "demônios" que habitam a mente humana, é o crescente número de pessoas que admitem sofrer de "fobia de impulsão". Sabe-se que a fobia de impulsão é o medo extremo de seguir um impulso, perder o controle e fazer mal a si mesmo ou aos outros. 
      Por que temos tanto medo assim de nossos impulsos? Por que não confiamos na nossa capacidade de domar a nós mesmos? Se o ser humano se orgulha tanto de ser o único animal racional do planeta, por que ele segue sendo o mais passional? Qual é a origem de nossos medos? 
              Acredito que a origem de nossos medos esteja em nossa insegurança. Somos inseguros, porque ainda não sentimos que temos as "rédeas" adequadas para domar a nós mesmos. E, sem rédeas, faremos bobagem diante da mínima frustração. Precisamos ser fortes a ponto das frustrações e rejeições do mundo lá fora não nos atingirem mais. E essa força de resiliência diante das frustrações só é adquirida a partir de uma profunda segurança interior baseada no amor-próprio. O desenvolvimento do amor-próprio é um dever de todo cidadão. Cidadãos com amor-próprio não vão enlouquecer diante de uma rejeição amorosa nem serão propensos aos crimes passionais. 

                       
           

            Quando uma pessoa diz que matou em nome do "amor", ela está dizendo que matou em nome do amor que ela julga não ter recebido do outro. Se alguém é capaz de matar o outro por não se sentir amado por ele, isso significa que a sua alma é isenta de amor-próprio. E a falta de amor-próprio quebra as "rédeas" da alma, deixando o ser humano mais suscetível aos seus excessos e às suas paixões desordenadas. 
            Quando temos amor-próprio, o amor é uma troca saudável de bons sentimentos e não uma dependência emocional. Se há crimes passionais ocorrendo na sociedade, podemos afirmar que temos uma sociedade que ainda confunde amor com dependência. O crime passional indica que a sociedade ainda está em um nível muito "infantil" e imaturo de compreensão do amor. 
              Costumamos pensar que as pessoas carentes são isentas de orgulho por causa do complexo de vítima delas e da aparência de "coitadas". Entretanto, não existe nada mais perigoso para a sociedade do que uma pessoa carente. Explico: a pessoa carente costuma misturar ódio com amor e fazer da mágoa uma fonte de cólera (ira). E essa mistura de ódio, amor, mágoa e ira é a raiz dos crimes passionais. E essa é a mistura mais orgulhosa que existe. Uma pessoa carente, apesar das aparências, é a pessoa mais orgulhosa que existe. A carência é o orgulho em alto grau: é a ambição de ser totalmente amada por todos sempre e, caso alguém não goste dela, ela vira um monstro. 
              A pessoa carente é um saco sem fundo. Por mais que ela receba amor, ela nunca estará satisfeita: sempre faltará "algo". Só que ela não pode exigir que o outro preencha todos os cantos de sua alma com o amor, pois existe uma parte de nós que apenas será preenchida com amor-próprio. Quando temos amor-próprio e segurança emocional, sabemos aceitar com sabedoria a rejeição dos outros. Sabemos que é impossível sermos amados por todos e abrimos mão do controle. Não podemos controlar o que o outro sente por nós. É preciso humildade para compreender a rejeição. E a maior contradição reside nesse ensinamento: para termos humildade, precisamos ter amor-próprio. 
          Equivocadamente, costumamos pensar que as pessoas com amor-próprio são vaidosas, metidas e narcisistas. Entretanto, elas são amáveis, generosas, humildes e incapazes de matar por causa do "amor", já que elas se amam e não precisam implorar o amor dos outros nem machucar alguém por causa de carência. Existe uma grande diferença entre amor-próprio e narcisismo. O justo amor por si mesmo é saudável e constrói a nossa saúde mental e emocional. O narcisismo, por sua vez, é doentio e egocêntrico. 

                       

          

         Aquele que se ama de forma saudável sabe acolher a si mesmo sem precisar da aprovação alheia. O narcisista, por sua vez, tem uma compulsão patológica por ser o centro das atenções e necessita de aplausos, afeto e aprovação alheia a todo instante. 
          Toda virtude, na verdade, está no equilíbrio. O caminho da sabedoria é o equilíbrio entre magnificência e humildade ou entre a modéstia e o amor-próprio. E não é preciso ser genial para perceber que há algo mais narcisista no carente do que naquele que se ama: o carente quer atenção para si mesmo sempre para suprir as suas inseguranças (existe algo mais narcisista e orgulhoso do que isso?), mas aquele que se ama dispensa a bajulação alheia.              Por incrível que pareça, torno-me mais generosa amando a mim mesma. Ao estar bem comigo mesma, sinto-me mais disposta a ajudar o próximo naquilo que o outro necessita. Entendendo e curando a mim mesma, posso entender e curar o outro com mais empatia, respeito e amor. Quando tenho uma autoestima saudável, expresso estima pelo próximo de forma mais terna e compassiva. Desse modo, torno-me uma pessoa mais doce e agradável para o convívio. E todos nós gostamos de pessoas gentis e agradáveis. 
          O paradoxo da pessoa carente é que a falta de amor-próprio torna a sua personalidade amarga, o que afasta os outros e, consequentemente, torna a pessoa ainda mais carente e perdida. A única maneira de romper esse círculo vicioso e paradoxal é amando a si mesma de modo a expandir uma energia mais agradável e, assim, atrair a genuína afeição do próximo. 
           O segredo da felicidade e das relações saudáveis está num círculo de amor puro e genuíno: devo amar o próximo como a mim mesma. Ao amar o próximo como a mim mesma, estou abraçando a lei do amor verdadeiro. Deixo de criar expectativas e deixo de depender do amor do outro para suprir as minhas carências. Sendo assim, passo a ser íntegra no amor: o amor me abastece por inteira e extravasa a ponto de abranger o próximo. O amor deixa de ser uma necessidade doentia de recebimento e passa a ser uma genuína escolha de doar afeto. 
            O amor é sobre doar afeto e não sobre receber. O maior paradoxo é que, quando aprendo a doar amor do jeito certo sem a expectativa da recepção, passo a receber muito mais amor dos outros também. Quem reclama que muito dá e pouco recebe não aprendeu a doar amor do jeito correto e ainda está muito agarrado ao seu ego. 
             É claro que devemos ter equilíbrio nas nossas relações, e a nossa doação tem de estar em harmonia com o que recebemos. Mas, se julgamos que recebemos "menos" amor, ainda não abraçamos a totalidade do amor e ainda estamos medindo o amor. Como dizia Santo Agostinho, a medida do amor é amar sem medida. Se medimos o amor com "fitas métricas", ainda não nos entregamos totalmente ao que o amor significa. 


                              

                   

               É certo que, nas nossas relações pessoais, escolheremos pessoas que também nos amam e que querem estar ao nosso lado. Mas, nesse texto, estou indo além: falo do amor enquanto sentimento universal. Atravessei as fronteiras de "Vênus", a deusa do amor pessoal, a bela Afrodite, e mergulhei nas brumas de "Netuno", no oceano do amor no sentido mais místico do termo. Nesse texto, expresso sobre a nossa missão de emanar um sentimento doce e calmo de amor e perdão inclusive sobre aqueles que não nos amam. É só amando quem me rejeita que venço a mágoa, a ira e a semente passional do ódio que habita em mim. 
                     É importante saber amar a si mesmo e expandir esse amor aos outros --incluindo aqueles que não merecem amor. O perdão também é uma face do amor que precisa ser cultivada em nós. Se sou carente e dependente do amor do outro, vou odiá-lo diante do menor gesto de rejeição (e isso não é amor). Como o amor pode se transformar em ódio de uma hora para outra só por causa de um gesto que me feriu ou por causa de uma suposta rejeição? Isso só denuncia o quanto o amor nunca foi verdadeiro. 
                O amor verdadeiro ultrapassa a mágoa e perdoa quem nos rejeita. O amor verdadeiro liberta o outro. O amor verdadeiro anda ao lado da liberdade. O amor verdadeiro não faz macumba para prender o outro nem quer o ex de volta dentro de três dias. Tudo isso é fruto do pecado, da natureza passional. O verdadeiro amor não tem nada a ver com isso. 


                                

                  

                 Não estou dizendo para ficar ao lado de quem nos rejeita nem para ficar sofrendo a falta do amor. Se o outro não quer mais a nossa presença na vida dele, vamos embora com um sorriso tranquilo e doce no rosto. Estou dizendo apenas para não amaldiçoar quem nos rejeita nem ficar com ódio daquele que não nos ama. Nós não precisamos disso. O ódio que nasce diante de uma rejeição é a causa do crime passional como vimos no início do texto. É perigoso pensar que esse tipo de sentimento estraga a humanidade e está na raiz dos crimes mais bárbaros do mundo. 
                Não foi à toa que o Mestre dos Mestres disse: "Ama o próximo como a ti mesmo." O nosso Salvador nunca dizia alguma frase à toa. Tudo o que Jesus dizia era repleto de significados profundos e representava os caminhos de cura para a alma humana. Jesus foi o Mestre em todos os sentidos e também foi o maior Mestre no ensinamento sobre amar e perdoar mesmo após a rejeição.
                  Jesus foi rejeitado no tempo Dele, apedrejado, injuriado, caluniado, agredido, julgado injustamente e até mesmo crucificado. E, mesmo na cruz, ele perdoa os inimigos, continua amando a todos e diz para o seu Pai: "Perdoa-lhes, eles não sabem o que fazem." Jesus nos ensinou como devemos agir diante de uma rejeição -- até mesmo na mais cruel e injusta. 
                   Jesus foi capaz de suportar uma cruz e continuar sereno, íntegro, vigilante e amoroso, pois tinha plena consciência de Sua missão. E nós? Como nós somos? Enquanto Jesus foi forte em todos os momentos da sua Paixão, nós ficamos fracos e temos atitudes mesquinhas, desesperadas e passionais diante da mínima rejeição. Jesus enfrentou uma coroa de espinhos, pregos nos pés e nas mãos com fortaleza de espírito. E nós somos fracos diante de uma mísera rejeição no Whatsapp. Nós ficamos furiosos diante de uma boba mensagem visualizada e não respondida e perdemos a razão diante de um mínimo olhar agressivo do outro. Por que somos tão fracos? 
                    É impossível sermos santos de uma hora para outra e passarmos a agir como Jesus em igual fortaleza de espírito. Mas é plenamente possível tomarmos consciência da nossa fraqueza espiritual e trabalharmos para sermos pessoas mais serenas e fortes a cada dia. 


                                

               

                  Vejo em Cristo o exemplo a ser seguido diante das rejeições. Podemos tentar nos aproximar a cada dia de Cristo em cada gesto e em cada atitude. Podemos respirar fundo antes de perdemos o controle e olharmos para a Cruz Dele que dissolve todo o nosso sofrimento. Perto do que Ele passou, tudo o que passamos fica pequeno e perde o sentido. Não há motivo para se enfurecer por bobagens de maneira tão passional e violenta. 
                  Podemos concluir que Jesus passou pela Paixão para curar a nossa natureza passional e pecadora. Se decidirmos seguir os ensinamentos de Jesus, não haverá mais crimes passionais em nossa sociedade. O perdão que Cristo pregou é a chave para a paz social. Podemos criar leis através do Direito, mas não podemos impedir os sentimentos violentos dos seres humanos. Apenas o desenvolvimento de uma consciência espiritual no ser humano pode domar a sua violência interior e fazer com que a sociedade cumpra as leis de maneira mais substancial. Quem ama o próximo como a si mesmo não mata o próximo na primeira decepção ou rejeição. 
                    Pode ser que a rejeição mexa com pontos vulneráveis do ego humano e com feridas ocultas, razão pela qual ela desperta sentimentos tão violentos e até mesmo crimes passionais. A rejeição talvez seja uma das piores provas espirituais que o ser humano passa. E não importa o quanto você seja bonito, amável, inteligente, generoso e gentil, pois, apesar de todas as suas virtudes, você também vai passar pela rejeição -- essa é a cruz da qual ninguém escapa.
                Se nem mesmo Deus feito carne em Jesus escapou da rejeição humana, por que nós meros mortais teríamos a tola esperança de agradar a todos? Nem Jesus agradou a todos -- e Ele era perfeito. Seria orgulho da nossa parte não aceitar a experiência da rejeição -- experiência que até mesmo Jesus passou. Quando aceitamos a rejeição como possibilidade, deixamos de nos desesperar diante dela. 
                Ser virtuoso não é garantia de total aceitação social. Ao contrário: em um mundo corrompido pelo pecado, quem prega a sabedoria, a virtude e a  luz pode ser rejeitado por muitos. Devemos ser quem nós somos sempre e termos plena consciência da nossa missão e da nossa jornada de vida para caminharmos serenos e justos ainda que a rejeição ocorra em alguma etapa da jornada. 

                         

          


              Não adianta negar quem nós somos para agradar os outros -- essa é outra armadilha que só trará rejeições piores e sofrimentos mais duros até você aprender a ser você mesmo com força e coragem. Independentemente de quem você for, você sofrerá a rejeição de muitos, porque o mundo é repleto de pessoas diferentes e que pensam de maneira diferente. Então, por que não ser você mesmo logo? A vida é curta demais para usar máscaras que não combinam com a sua essência. Todos nós temos o direito e o dever de sermos verdadeiros com a nossa própria essência. Ser verdadeiro consigo mesmo é ser verdadeiro com os outros também e contribuir para uma sociedade mais justa e verdadeira. 
              Encontrar o equilíbrio entre expressar minhas verdadeiras opiniões e, ao mesmo tempo, ser gentil e evitar ferir o outro desnecessariamente é uma longa estrada. Muitas vezes, ficamos perdidos entre dois caminhos: sufocar a essência de forma doentia para agradar os outros (e, quando a essência escapa de vez, ela vira um bicho feroz e se manifesta em atitudes loucas) ou mostrar a essência de forma combativa com um excesso de sinceridade que vira grosseria (o que também leva à loucura). O bom senso é o equilíbrio entre verdade e diplomacia. 
                    E a sabedoria por trás da rejeição é justamente lapidar a alma e mostrar ao ser humano que é impossível agradar a todos. A rejeição pode ser uma ferida emocional que destrói a sua autoestima ou pode ser a mola propulsora de uma autoestima ainda mais elevada: decidir continuar se amando mesmo quando os outros não me amam mais revela uma profunda maturidade na relação consigo mesmo. 
                      Ainda somos muito infantis e baseamos o nosso amor-próprio no que os outros sentem por nós. Se alguém nos ama menos, nós passamos a amar menos a nossa personalidade. Mas nós não mudamos. Quem mudou foi o outro. Se o outro passou a me amar menos, o problema é dele e não meu. Seguirei me amando, porque o amor-próprio é a base da saúde emocional. O amor-próprio é uma escolha. Não tenho controle do que o outro sente por mim, mas posso e devo ter controle sobre o que sinto por mim. Não tenho controle sobre as atitudes do outro, mas posso ter controle sobre a minha reação. Tudo é responsabilidade minha no final das contas. 


                                  

                  

               É infantilidade querer culpar o outro sobre os maus sentimentos que brotam em nós sobre o outro, sobre a vida ou ainda sobre nós mesmos. Nós somos responsáveis por construir bons sentimentos em relação ao outro, a nós mesmos e à vida. Nós somos responsáveis por tudo. Essa noção de responsabilidade pode doer, mas é a partir dessa consciência que alcançamos a liberdade verdadeira por mais contraditório que isso possa parecer. Quando deixo de depender do outro para me sentir bem comigo mesma, conheço a verdadeira liberdade. Quando deixo de culpar a sociedade pelo mal no mundo e passo a fazer o bem de modo independente, por exemplo, conheço outro nível de liberdade em que me desenvolvo pessoal e espiritualmente. 
                       Além do mais, boa parte da dor da rejeição vem de fantasias vitimistas. Quando somos rejeitados, criamos novelas em nossas cabeças onde somos coitados injustiçados por causa de  "vilões". O vitimismo é uma fantasia mental. Quando sou rejeitada, não sou uma coitada. Afasto a tendência de fazer drama com a minha situação. Eu sou um ser humano forte, livre e independente que não encaixa mais na vida de fulano ou beltrano. Simples assim. Tudo bem se alguém sair da minha vida ou der sinais de rejeição, pois o problema é do outro e não meu. A maior "vingança" é manter-se intacto, livre e indiferente diante da rejeição. Afasto-me da vida do outro com elegância e com um sorriso no rosto ao invés de me descabelar. 
                      O certo seria continuar transmitindo sentimentos de amor fraterno ao outro como Cristo ensinou e perdoá-lo, mas, caso eu não consiga sentir amor por quem me feriu (o que pode ser muito difícil para nós humanos), vou ter um sentimento de compaixão por ele pelo menos (compaixão pelo simples fato do outro ser um ser humano, já que o amor pessoal acabou). Quando o amor pessoal acaba, o amor universal, fraternal e cristão deve entrar em cena, senão o ódio humano toma conta e até mesmo barbáries podem ocorrer. Independentemente de tudo, devo seguir respeitando o outro, porque o respeito é universal. 
                      Por mais que o outro não mereça, devo continuar transmitindo compaixão a ele. Chega um momento onde quem ama o outro dentro de mim é Cristo, pois já não sou capaz de amá-lo pessoalmente. Nesse sentido, é tão importante o desenvolvimento de uma consciência espiritual e fraternal. A expansão da consciência amorosa é muito importante na construção de uma sociedade com mais paz. Quando não sou mais capaz de amar uma pessoa por causa de uma situação, que Cristo reine em mim e a ame por mim. É para Cristo que devo dar o meu coração e não para o ódio passional nem para a mágoa. 

                                    

                         

                  Tudo depende da maneira com a qual encaramos a rejeição. E não falo aqui somente da rejeição de um namorado ou de uma namorada, mas da rejeição de um amigo, de um primo, de um irmão, de um tio, de uma tia, de uma neta, de um avô e etc. A rejeição também pode vir dos colegas da sala de aula, do professor e dos amigos. E, por falar em rejeição em sala de aula, nunca vimos tantos casos de violência nas escolas. Até pouco tempo atrás, alunos com armas matando colegas e professores eram incomuns -- tais crimes ocorriam em poucas partes do planeta ou só ouvíamos falar de crimes assim nos Estados Unidos. Hoje temos violência nas escolas em todos os cantos do planeta, incluindo o Brasil. 
                O massacre na escola de Suzano (SP), por exemplo,  chocou o Brasil. O Bullying e a rejeição são marcas indeléveis que, caso não sejam sanadas com sabedoria e amor-próprio, podem tornar a pessoa um monstro capaz das vinganças mais injustas e cruéis da história. E a raiz de crimes escolares não está no porte de arma, mas nos sentimentos do ser humano por trás da arma. Colocar a culpa no videogame violento e no porte de armas é fugir da verdadeira raiz do problema: a incapacidade do ser humano lidar com a rejeição. 
         E não basta fazer campanhas contra o Bullying, é preciso ensinar cada pessoa a fortalecer a alma para enfrentar as rejeições da vida. Sofrer injúrias e rejeições é algo inevitável da vida. Se não sofro com injúrias na escola, vou me deparar com elas em algum momento da minha vida. A responsabilidade de suportar as injúrias com equilíbrio e se defender delas com elegância e lucidez (sem violência) é de cada ser humano. Devemos encarar as rejeições de forma mais lúcida e menos dramática. Apenas parando de dar importância para quem nos rejeita e dirige injúrias contra nós, poderemos crescer em sabedoria e amor-próprio e teremos uma sociedade mais sábia e leve. 
           Podemos encarar a rejeição de um modo desastroso ou como o caminho da nossa sabedoria. Quem me rejeita pode ser um mestre capaz de me mostrar as chaves da sabedoria. Quem me rejeita pode me ensinar coisas -- o que é bastante provável, pois tudo na vida é ensinamento. Antes de cair em lástimas, pergunte-se: o que essa situação dolorosa quer me ensinar? 


                                      

                     

                     Algumas respostas podem chegar diante dessa pergunta. Posso aprender a ser mais humilde. Posso aprender a ser mais amável. Posso aprender a ser mais forte. Posso aprender a ser mais independente. Posso aprender coisas infinitas. Posso extrair coisas boas dos males que sofri. Posso transformar a minha dor em paz e alegria dentro de mim. E essa responsabilidade é só minha. 
                            A maior sabedoria por trás da rejeição é elevar a consciência espiritual que habita em nós. Citei Cristo no texto, pois sou católica, mas quase todas as religiões falam sobre amor universal e manter-se forte diante dos males da vida. Quase todas as religiões falam de uma responsabilidade pessoal e intransferível sobre os sentimentos de nossa alma. Além do cristianismo, o budismo também defende o exame de consciência. No cristianismo, pedimos perdão pelos nossos pecados e tentamos purificar o que mancha o nosso interior. E, no budismo, vemos as ilusões do ego por meio da meditação e almejamos alcançar uma mente serena, clara e límpida. 

                               

                         


                  Mergulhos sinceros em nossa alma precisam ser feitos. Exames de consciência sempre são feitos em qualquer religião. Podemos fazer um exame de consciência agora: o que desperta sentimentos ruins e passionais de mágoa em mim e como posso trabalhar o meu interior e me libertar de tudo isso? Deixo esse exame de consciência para o leitor. Independentemente de sua religião (ou até mesmo se você não tem religião e é ateu), busque a expansão da consciência. Sempre vale a pena tornar a nossa mente mais lúcida e libertá-la da escravidão dos sentimentos passionais. Enquanto católica, Cristo é meu exemplo de lucidez. 
                       Para mim, a maior prova da Divindade de Cristo está na lucidez com a qual enfrentou a Cruz sem manifestar qualquer sentimento de mágoa em relação aos seus carrascos (Ele foi muito elevado para o padrão sentimental humano, demonstrando a serenidade e a lucidez total de Deus). Nenhum ser humano reagiria à humilhação, à tortura injusta e à crucificação de modo sábio, lúcido e sem perder o controle. A prova do Divino em Jesus está aí. A Cruz revelou a Sua Glória ao mundo. 
                   Nesse sentido, quem é cristão tem a obrigação de seguir a Jesus e de viver de acordo com Ele inclusive nos momentos de rejeição. Se Jesus perdoou quem o crucificou, quem sou eu para não perdoar uma mísera mágoa? Nossos sofrimentos e nossas mágoas tornam-se pequenos diante da Paixão de Cristo. Todo o Cristianismo está baseado no perdão. Quando Pedro aproximou-se de Jesus e perguntou-Lhe "Senhor, quantas vezes deverei perdoar a meu irmão quando ele pecar contra mim? Até sete vezes?", Jesus revelou essa verdade: "Não até sete, mas ate setenta vezes sete." O perdão também está na oração do Pai-Nosso: "Perdoai-nos as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido..."


                          
               

                  Quantos crimes passionais seriam evitados com o perdão? Quantas violências escolares seriam evitadas com o perdão e a compaixão? Quanta paz seria acrescentada em nosso sociedade e em todo o mundo se cada coração humano começasse a perdoar as ofensas do próximo? A mudança que queremos ver no mundo começa dentro de nosso coração. 
                  A sabedoria por trás da rejeição consiste em atingir outro nível de sabedoria, onde aprendemos a amar e a perdoar quem não nos ama mais. A nossa vaidade tende a amar somente aqueles que nos amam, mas isso ainda é uma forma muito imatura de amor. O amor cristão pede um amor maior, mais expansivo e universal. Esse caminho de amor é diário e pode parecer difícil, mas ainda é muito melhor do que o tortuoso caminho do orgulho e do ódio. 
                    Quando alguém nos fere, nos rejeita e deixa de nos amar, parte de nós se sente menos amado e passa a se amar menos. Mas a falta de amor do próximo não pode afetar o amor que tenho em relação a mim mesmo nem pode afetar o amor que sinto pelos seres humanos em geral e a compaixão que devo continuar a sentir por ele. O ego ama alimentar um discurso vitimista e, para tanto, fantasia, dramatiza e cria a mágoa. A mágoa vira ira, ódio e leva à destruição. 
                 Sendo assim, não basta fortalecer o amor-próprio para superar uma suposta "rejeição", é preciso se livrar do discurso vitimista dentro de nossa mente que diz que somos "bobos" por amarmos que nos rejeita. Amar quem não merece não faz ninguém mais bobo, mas pode fazê-lo mais santo e  até mesmo aproximar-lhe do amor pedido por Jesus além de trazer mais sabedoria e expansão de consciência em sua vida. 
                   Saiba que bobo é quem deixou o amor apodrecer dentro de si e perdeu a sua alma para a mágoa e para o ódio. O amor não é uma bobagem romântica, mas a única salvação verdadeira da alma.  Afaste-se de quem não quer mais você e jamais aceite qualquer tipo de violência, mas cultive o amor e a compaixão em seu coração para si mesmo e para todos, incluindo aqueles que rejeitaram você.  
             Salienta-se que a autoestima vai além de considerar-se belo, virtuoso e reconhecer a própria luz. A autoestima profunda é ter plena consciência de quem você é e não deixar que a opinião alheia interfira nessa consciência. Jesus amou os inimigos, pois tinha plena consciência de quem Ele era e ainda perdoou-lhes ao saber que eles não tinham a mesma consciência plena de quem Ele era ou do que estavam fazendo contra Ele. 


                             

          

                     No Getsêmani, o apóstolo Pedro ficou revoltado ao ver os soldados romanos que levariam Jesus para cruz e cortou a orelha de um dos soldados, o Malco. Mas, Jesus diz para Pedro que aquele não era o caminho e ainda cura a orelha do soldado romano diante de Pedro. Jesus diz a Pedro: "Mete a tua espada na bainha; não beberei eu o cálice que o meu Pai me deu?"
                       Com essa passagem bíblica, podemos concluir que a violência e a revolta não são os caminhos corretos diante dos cálices amargos. Jesus tinha consciência do cálice amargo que tomaria e da Cruz pesada que carregaria, mas continuou amando a todos ao seu redor. É certo que a rejeição é um cálice amargo, mas não podemos sair por aí magoados e com a espada nas mãos. Mágoa e espada não combinam. Diante de uma rejeição, vamos guardar as nossas espadas na bainha e perdoar quem nos feriu -- só assim teremos a paz de Cristo e seguiremos em frente. 
                   O ódio seria um caminho muito fácil e destruidor. Mas o ser humano não nasceu para o ódio e sim para o amor. Todas as vezes em que nos afastamos do amor e do perdão somos arrastados pelas nossas paixões desordenadas e destruídos por completo. Para amar a si mesmo após uma rejeição e continuar desejando o bem para aquele que nos rejeitou, é preciso ir além e ser mais profundo. É preciso ter a consciência de que tudo é amor e que, se o outro não vibra no amor, o problema é do outro e não seu. A rejeição é um veneno que só mata a sua alma se você tomá-lo com mágoa. Vamos vibrar no amor -- esse é o caminho, a verdade e a vida. A mágoa levará ao caminho dos falsos discursos vitimistas da mente, da destruição e da morte. 
                Os outros até podem pecar por falta de amor, mas nós não podemos. Quem despertou a consciência sente até compaixão por aquele que perdeu a capacidade de nos amar. Não vamos alimentar mágoas daqueles que nos rejeitam injustamente. Ao contrário, vamos rezar por eles para que eles um dia possam sentir o amor universal dentro de seus corações. A sabedoria por trás da rejeição é permitir que ela alargue o nosso coração ao invés de destruí-lo
              

Texto escrito por Tatyana Casarino. 

Tatyana Casarino é Especialista em Direito Constitucional, Advogada, escritora, poetisa, estudiosa de ensinamentos religiosos e aprendiz de assuntos que envolvem autoconhecimento.