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quarta-feira, 20 de novembro de 2019

10 Cenas de Horror da Disney.

                    


   Olá, pessoal! Hoje a postagem foi escrita pelo meu amigo escritor Mateus Ernani Heinzmann Bulow que fez uma análise de dez cenas de terror dentro do universo da Disney. Conhecida como uma empresa de animação romântica e doce, a Disney também já produziu cenas assustadoras (cenas que assustam crianças e adultos até hoje).
   Talvez essas cenas da lista abaixo assustem mais os adultos, visto que, quando somos crianças, nossa inocência não nos permite captar certos aspectos sombrios da natureza humana refletidos nos contos de fadas.
     É provável que as crianças de hoje em dia não tenham conhecimento de tais cenas, pois elas fazem parte de animações antigas e históricas da Disney. Todavia, certamente está presente na memória dos amantes da Disney, de quem estuda o universo "nerd" e de todos aqueles que viveram a sua infância em décadas anteriores, especialmente nos anos 90 (eu e o autor do texto vivemos nossa infância na década de 90).

                           

      

       Se você gosta de um terror leve ou ainda não gosta de terror apesar de ser curioso em relação ao universo Disney, este texto é para você! Planejamos esse texto para ser publicado no Halloween, mas somente conseguimos publicar o texto hoje. 
  Independentemente da data que este texto está sendo publicado, é interessante observar o aspecto "lúdico" do medo e os arquétipos de medos que são trabalhados pelos autores dos contos de fadas e pelos produtores dos desenhos animados. Como eu sempre digo, por trás de um conto de fadas, há um produtor adulto repleto de esperanças e medos infantis. Boa leitura! 

10 Cenas de Horror da Disney.

Um dos sentimentos mais primitivos nos seres humanos é o medo. Pode ser o medo do escuro, dos bandidos, de lugares fechados, das baratas. Ele estará por perto, espreitando-nos como um caçador implacável, apenas esperando o momento de estourar nos cantos mais escuros da mente humana...
O medo não é um sentimento ruim em sua totalidade. De certa forma, a humanidade chegou longe graças à capacidade de reconhecer o perigo e ficar longe dele, afastando-se de predadores e animais venenosos, além de evitar medidas destemperadas por meio do bom senso e da ponderação, aliada a uma boa dose de receio e cautela.
Por incrível que pareça, o medo pode atacar em situações inesperadas, incluindo desenhos animados. Pergunte a quem possuir mais de vinte anos, entre fãs de horror e pessoas que estão fora do círculo de apreciadores do gênero: possivelmente haverá uma ou outra cena de um desenho animado no meio da lista de momentos horripilantes. E tenha certeza que ao menos uma delas pertencerá a uma animação da Disney.
A proximidade do dia das bruxas despertou a ideia de uma lista de momentos assustadores da Disney, porém não consegui terminá-la a tempo, devido a fatores externos. Mas aí está ela, após uma demora inesperada, com dez cenas dignas de filmes de terror, enfileiradas em ordem cronológica entre curtas animados e filmes de longa-metragem.
E agora eu deixo os senhores e senhoras aproveitarem a estadia, enquanto abro lentamente a velha porta de entrada da Mansão Assombrada, antes de sumir sem deixar rastros. Apenas tomem cuidado ao passarem pelos corredores estreitos, e não prestem atenção na criança chorando naquele canto escuro...

1-Mickey na Casa Assombrada (1929).



Esse filme de sete minutos foi a primeira incursão de um personagem da Disney no gênero terror, e não podemos analisar sua produção sem falar em outras animações de Walt Disney nas décadas de 1920 e 1930, chamadas Silly Simphonies (“Sinfonias Ingênuas”). As Silly Symphonies foram produzidas até 1939, servindo como animações experimentais para Walt Disney e sua equipe.
O curta-metragem Haunted House (“Casa Assombrada”) foi lançado logo após a primeira das histórias das Silly Simphonies, chamada Skeleton Dance (“Dança dos Esqueletos”), e possui animação reutilizada em algumas cenas a partir da segunda metade. É até curioso ver o apreço de Walt Disney pelos “ossudos” dançantes, indicando aí um possível gosto pelo macabro e pelo sinistro, pouco condizente com a imagem habitual da empresa.
Na história, Mickey precisa encontrar um abrigo durante uma tempestade, e escolhe uma casa suspeita nas redondezas. O ratinho explora alguns recintos da estranha residência e percebe que está sendo perseguido pelo que parece ser uma sombra viva. O fantasma é um esqueleto encapuzado e encurrala Mickey em uma sala escura; o pobre ratinho é obrigado a tocar um piano, enquanto os mortos se divertem.
Após tocar algumas músicas para os esqueletos, Mickey consegue escapar do trabalho involuntário como animador de festas, aproveitando-se de uma súbita distração dos seus “contratantes”. Depois de sofrer mais sustos durante a fuga, com direito a um barril cheio de esqueletos, Mickey foge da casa assombrada, após o fim da tempestade da noite anterior e a chegada do dia.







2-O Julgamento do Pluto (1935).



Nosso próximo colocado é outro curta animado, originalmente chamado “Pluto’s Judgement Day” (literalmente, “O Dia do Julgamento do Pluto”), além de ser um dos primeiros realizados em cores pela Disney. No início da história, Pluto persegue um pequeno gatinho e leva uma tremenda bronca do Mickey; o camundongo ainda afirma que cedo ou tarde Pluto teria de responder pelos inúmeros gatos que perseguiu durante a vida.
Pluto dorme em frente à lareira e é despertado por um gato metido a provocador, que irrita o cão até este começar a persegui-lo. A perseguição acaba em uma caverna em forma de cabeça de gato (bem parecida com a caverna de tesouros do Aladdin, aliás), e Pluto percebe tarde demais que caiu em uma armadilha dos gatos; estes almejam julgá-lo pelos crimes contra a espécie deles.
O julgamento é manipulado por todos os envolvidos, e os gatos nem disfarçam suas intenções. Um detalhe interessante envolve o juramento com a pata de Pluto sobre a Bíblia, que na verdade é uma lista telefônica, enfatizando o caráter arbitrário e parcial do júri. Curiosidade extra: esse ato de jurar dizer a verdade nos tribunais é exclusivo dos EUA, não existindo procedimento similar no Brasil.
Após ouvir os testemunhos de gatos que sofreram com a perseguição de Pluto, o júri decide pela condenação do cachorro, que é levado a uma cadeira suspensa sobre chamas. Após ser atingido por uma brasa, Pluto acorda apavorado e corre até uma bacia cheia d’água, onde Mickey está dando um banho no gatinho perseguido no início da história.
Alguns trechos desse curta animado foram censurados ao longo dos anos. A mais notável das cenas cortadas envolve três gatinhas lamentando a morte de seu tio, chamado Tom. Devido à presença de estereótipos raciais na cena, bem como à presença de alguém chamado Tom (referência ao romance “A Cabana do Pai Tomás”, ou “Uncle Tom’s Cabin”, no original), esse trecho seria cortado em exibições posteriores.






3-Branca de Neve atravessando a floresta – Branca de Neve (1937).



A veia macabra de Walt Disney pode ser percebida logo no primeiro longa-metragem do estúdio, considerado até hoje um marco da animação no cinema. Apesar de não durar mais que alguns minutos, a travessia de Branca de Neve pela floresta durante a noite é de arrepiar os cabelos de qualquer um.
Como alguém que já possui experiência em acampamentos, eu posso afirmar que uma floresta se torna outro lugar durante a noite. Qualquer barulho vira um estrondo, mesmo as folhas caindo no chão se parecem com passos; os animais noturnos, como os grilos e os sapos, também oferecem sua “contribuição” para tornar o ambiente mais soturno, ou no mínimo desagradável para quem estiver sozinho...
O terror começa logo após Branca de Neve quase ser assassinada pelo caçador, após o mesmo receber ordens da Rainha Grimhilde para eliminar a enteada. Felizmente, o rude sujeito desiste de levar seu intento adiante e ordena à menina que fuja do castelo o quanto antes. A princesa adentrou o matagal após levar um tremendo susto com a tentativa de assassinato.
Diga-se de passagem, os animadores retrataram bem o medo em uma floresta escura: cada galho é uma enorme mão, disposta a agarrar o que estiver em seu caminho; um tronco flutuando sobre a água é um crocodilo faminto; olhos se espalham por todos os lados. Agora ponha no meio desse “inferno verde” alguém que até então se envolvia com trabalhos domésticos, sem experiência alguma em um local tão inóspito.
A sorte de Branca de Neve foi ter encontrado animais amistosos, sem nenhuma fera entre eles, como ursos ou lobos; não demoraria até a princesa encontrar um refúgio seguro na casa dos Sete Anões. A floresta assustadora ficaria para trás, porém sua terrível madrasta não desistiria tão facilmente...




4-A Ilha dos Prazeres – Pinóquio (1940).



“Isso é de graça”. Talvez seja uma das maiores ilusões do mundo, e é surpreendente que muitas pessoas ainda acreditem em promessas de gratuidade absoluta, sem nenhuma contrapartida. Esse sentimento é visível no trecho da “Ilha dos Prazeres”, onde crianças mal-educadas são levadas para se divertirem sem sofrerem reprimendas, até que o preço aparece da forma mais desagradável possível...
Na história original de Carlo Collodi, o criador do Pinóquio, o local não era uma ilha, e sim uma cidade, chamada Paese del Balocchi (literalmente, “Terra dos Brinquedos”). Poucos detalhes são descritos sobre essa estranha localidade na obra original, e quase todas as adaptações possuem detalhes próprios. O propósito sinistro desse lugar é sempre o mesmo: transformar crianças em jumentos, que serão vendidos a quem tiver interesse.
Na versão do filme de 1940, a Ilha dos Prazeres é uma formação rochosa oculta em uma caverna pouco acima do nível do mar, fora da jurisdição de qualquer país. Para alcançar o local é preciso embarcar em um navio a vapor, após uma longa viagem em uma carruagem conduzida pelo Cocheiro, puxada por duas parelhas de jumentos.
As diversões oferecidas na Ilha dos Prazeres são variadas: fumo, bebidas alcoólicas, vandalismo, brigas entre crianças, mesas de bilhar, jogos de azar... E sem qualquer custo! Ao menos até as orelhas crescerem, caudas começarem a aparecer nos buracos das calças, e as risadas serem substituídas por zurros...
O trecho da Ilha dos Prazeres parece mais assustador quando você se torna adulto e compreende a situação dos desafortunados meninos. Um momento de cortar o coração é quando um burrinho chora pela mãe, antes de ser atirado em um cercado; outra cena arrepiante é a transformação de Lampwick (em algumas traduções brasileiras, Lampwick é chamado “Pavio” ou “Zé Bagunça”) em burro. Pinóquio fugiu da ilha antes da transformação se tornar irreversível, mas nenhum dos outros garotos teria a mesma sorte.




5-Noite no Cerro Calvo – Fantasia (1940).



Uma das obras mais conceituadas de Walt Disney é Fantasia, sua terceira realização em longa-metragem. Quase todos os espectadores que ainda guardam Fantasia em sua memória se lembram do trecho do Mickey aprendiz de feiticeiro, na qual o camundongo causa uma terrível confusão ao dar vida às vassouras. O segmento final também é relativamente conhecido, devido ao seu conteúdo no mínimo perturbador...
A trilha sonora da Noite no Cerro Calvo é cortesia da obra original homônima, composta em 1867 pelo russo Modest Petrovich Mussorgsky, um grande estudioso do folclore eslavo pré-cristão. Não existem diferenças significativas nos enredos, pois ambos envolvem fantasmas, bruxas e outras criaturas malignas festejando o Dia das Bruxas em uma montanha sombria. Em Fantasia, entretanto, destaca-se a imponente figura do demônio Chernabog, que foi baseado em uma divindade eslava pré-cristã.
O segmento da Noite no Cerro Calvo começa com Chernabog despertando no alto de uma montanha escarpada e lançando suas garras sobre uma pacata cidade à beira do morro. Os mortos despertam com o chamado de seu “mestre”, ao lado de outras criaturas como harpias, dragões e duendes de aparência horrível. Quando todos os “convidados” chegam ao topo, a farra começa: os demônios dançam como se não houvesse amanhã, enquanto Chernabog arremessa alguns deles rumo às chamas do Inferno.
A “diversão” de Chernabog e de seus asseclas dura a noite toda, indo até a manhã do dia seguinte, quando os sinos da igreja da vila começam a tocar em três badaladas, anunciando o Dia de Todos os Santos. Os espíritos malignos se recolhem às profundezas da terra, enquanto Chernabog se abriga sob suas asas e os fantasmas retornam aos seus respectivos túmulos. Em comparação com o festim dos mortos e entidades sombrias, o trecho final é um dos mais belos do filme inteiro, envolvendo uma procissão cantando “Ave Maria” de Schubert.




6-Sir Ichabod fugindo do Cavaleiro sem Cabeça – Aventuras de Ichabod e Mr Toad (1949).


Assim como Fantasia, Aventuras de Ichabod e Mr Toad é um filme dividido em histórias separadas, nesse caso em apenas duas. Este seria o último filme de antologia de animações da Disney, bem como a última produção realizada na década de 1940, sendo imediatamente seguido pelo filme da Cinderela.
A primeira história foi vagamente baseada no conto “O Vento nos Salgueiros” (“The Wind in the Willows” no original), escrito pelo escocês Kenneth Grahame, e fala a respeito de um sapo trapalhão obcecado por automóveis. A segunda história, por sua vez, possui como fonte um conto escrito pelo americano Washington Irwing, chamado “A Lenda do Cavaleiro sem Cabeça” (“The Legend of Sleepy Hollow”, no original). A adaptação do conto de Irwing na animação é bem fiel, salvo pelo final abrandado.
Ichabod Crane é um tímido professor vindo de Nova York para lecionar em uma cidadezinha do interior, e logo caiu nas graças dos moradores locais, apesar dos trejeitos desajeitados. O professor bonachão não demora a entrar em atritos com Abraham Brom Bones, um caçador e herói local da vila; a razão da querela se deve ao fato de ambos amarem a mesma jovem.
Em uma noite fria e ventosa, todos os moradores se juntam na taverna, a fim de ouvirem e contarem histórias assustadoras. Brom Bones decide assustar Ichabod com a história do cavaleiro sem cabeça, uma tarefa na qual foi bem sucedido, pois o professor decide sair mais cedo da festa (Brom Bones e o Gaston da Bela e a Fera possuem semelhanças na personalidade, analisando em detalhe).
O retorno de Ichabod à sua casa, como poderia se esperar, não é nada tranquilo: Mesmo antes da ação estourar de vez, a tensão é construída lentamente, no silêncio da noite quebrado pelo assovio do professor e pelos cascos de seu cavalo. E a aparição do Cavaleiro sem Cabeça é de arrepiar os cabelos! Do alto de uma colina, montado em um cavalo negro, carregando uma espada enorme na mão direita e uma abóbora na mão esquerda, isso sem contar a risada macabra (como um homem sem cabeça consegue rir é outro mistério...).
A cena de fuga de Ichabod dura pouco mais de três minutos, e apesar de cômica, carrega uma dose considerável de tensão e urgência, o que em bom “brasileirês” chamamos popularmente de “Corre, filho da mãe! Corre!”. Embora não seja explicitado no conto original ou nessa versão, é possível que o Cavaleiro sem Cabeça seja Brom Bones disfarçado, afinal desde o início da história ele faz brincadeiras e peças com o pobre Ichabod.
Diferentemente do conto original, onde Ichabod desaparece sem maiores explicações, nessa versão o protagonista aparentemente sobrevive à noite de terror, constituindo família em outra localidade. As únicas semelhanças com o fim da história original envolvem o casamento de Brom Bones com a jovem Katrina e a presença de uma abóbora quebrada em pedaços, no mesmo lugar onde Ichabod sumiu sem deixar rastros.




7-O Túmulo de Scrooge – O Natal de Mickey Mouse (1983).



Esse especial de natal foi baseado no livro “A Christmas Carol” (“Um Conto de Natal”, em uma das inúmeras traduções livres em português brasileiro) de Charles Dickens, sendo lembrado como o retorno de Mickey e seus amigos aos cinemas, após trinta anos. Entretanto, como veremos a seguir, nem mesmo os especiais de natal da Disney se escaparam de uma dose considerável de elementos assustadores.
O “A Christmas Carol” original era uma história simples, na qual um sujeito avarento e desonesto chamado Ebenezer Scrooge é assombrado pelo fantasma de um companheiro de negócios, tão ganancioso quanto o protagonista. Conforme a história avança, surgem três espíritos do Natal no caminho de Scrooge, representando Passado, Presente e Porvir, e após ver as consequências de seus atos, o outrora ganancioso banqueiro torna-se um sujeito melhor, compreendendo o verdadeiro significado do Natal.
Nessa adaptação da história, Ebenezer Scrooge é “interpretado” pelo Tio Patinhas, o que é apropriado, pois o velho pato é ganancioso e se chama “Uncle Scrooge” em sua língua original. A história é seguida com fidelidade em relação à obra de Dickens, apenas com personagens da Disney interpretando os personagens originais, e ela se encontra nesta lista devido a uma cena próxima ao final, a qual eu confesso que ainda passa alguns calafrios...
No livro original de Charles Dickens, o encontro de Scrooge com o Espírito do Natal do Porvir servia como clímax, onde o protagonista era obrigado a ver as consequências de seus atos, descobrindo que morreria sozinho e sem deixar saudades. Na versão da Disney, Ebenezer Scrooge é levado a uma cova ainda aberta, e com horror descobre se tratar do próprio túmulo, antes de ser empurrado pelo Espírito do Natal Porvir, interpretado pelo João Bafo de Onça.
Se isso já parece horrível o bastante, prepare-se que fica pior! Scrooge consegue se agarrar em uma raiz antes de atingir o fundo, e logo abaixo dele um caixão se abre sozinho, revelando um fogaréu terrível, presumidamente o inferno. Desesperado, o avarento começa a berrar “Eu mudarei! Eu mudarei!”, antes da raiz se soltar da terra e ele ser engolfado pelas chamas do inferno.
A sorte de Scrooge/Tio Patinhas é que tudo aparentemente não passou de um sonho ruim, e ele acorda em sua própria cama, agora um novo homem, melhor dizendo, um novo pato. Uma curiosidade extra: o relativo sucesso desse especial seria um dos catalizadores da série Ducktales – Os Caçadores de Aventuras; o dublador original do Tio Patinhas, o já falecido Alan Young, fez sua estreia nesse especial de natal.




8-O “Jardim” de Pólipos da Úrsula – A Pequena Sereia (1989).



Um ditado antigo afirma que “a memória do credor sempre é melhor que a memória do devedor”. Entretanto, alguns cobradores conseguem queimar nas lembranças de seus respectivos devedores, como é o caso de Úrsula, a terrível Bruxa do Mar e rival de Tritão pelo controle de Atlântida.
Na história original da Pequena Sereia escrita por Hans Christian Andersen, a Bruxa do Mar servia como personagem de fundo, além de alertar a protagonista das consequências terríveis que a aguardavam após a troca de sua voz pelo belo par de pernas. Não é o caso da adaptação da Disney, pois Úrsula utiliza de intimidação e discursos vagos ao oferecer seus “préstimos”, junto a um método questionável de resolução de insolvências, transformando devedores em pólipos, uma espécie de criatura marinha.
Logo na entrada do esconderijo da bruxa é possível ver um “jardim” dessas criaturas dignas de pena, o que deveria servir como um bom alerta dos riscos ao se negociar com Úrsula. Como se não bastasse a triste condição de imobilidade dessas “Pobres Almas Desafortunadas” (nome da música da vilã, aliás), os pólipos gritam e choram sem parar ao se lembrarem de suas vidas passadas.
Perto do final do filme, Ariel quase é transformada em um pólipo por Úrsula, após descumprir sua parte no “acordo”, mas é salva pelo Rei Tritão, quando este decidiu assumir seu lugar. Felizmente, a situação se inverte a favor dos heróis, graças à intervenção de Eric, quando este utiliza o mastro de um navio naufragado para matar Úrsula e desfazer a magia; não apenas Tritão volta ao normal, como todas as pessoas transformadas em pólipos.




9-Frollo cantando “Fogo do Inferno” – O Corcunda de Notre Dame (1996).



Se o leitor passou pela minha lista dos 10 Maiores Vilões da Disney, certamente percebeu a posição “privilegiada” do juiz Claude Frollo em segundo lugar, logo após o Cocheiro do Pinóquio. Todos os aspectos do antagonista do Corcunda de Notre Dame são no mínimo desconfortáveis a qualquer pessoa decente, especialmente sua motivação libidinosa por trás dos atos mais violentos.
Na obra original de Victor Hugo, Frollo é um personagem humano, e talvez mais assustador devido a esse aspecto: em comparação com o sinistro juiz enraizado na cultura popular, Claude Frollo possui momentos de genuína compaixão com seu filho adotivo, Quasímodo, além de assumir dívidas de seu irmão, Jehan. O lado maléfico do Arquidiácono aparece quando ele sucumbe à tentação de possuir a cigana Esmeralda, e a partir daí, é só “ladeira abaixo” até começarem as tragédias.
Apesar de reter boa parte dos aspectos humanos e plausíveis do personagem original, a versão de Frollo para a Disney é menos simpática, capaz de humilhar e desdenhar de Quasímodo, além de apenas ter aceitado adotar ele por medo do inferno. Isso sem contar as tendências genocidas em relação aos ciganos, que se tornaram mais intensas após o desejo sexual por Esmeralda despertar como um fogo ardente...
A canção do “Fogo do Inferno” é uma cena capaz de queimar (com o perdão do trocadilho) na memória, apesar de durar pouco menos de três minutos. Nessa canção, Frollo observa as chamas na lareira assumirem a forma de seu objeto de desejo, e tenta se desvencilhar do sentimento de culpa, enquanto inúmeras figuras envoltas em capuzes vermelhos o julgam culpado.
Em retrospecto, a cena do “Fogo do Inferno” causa um desconforto ainda maior, quando vista hoje em dia. Não apenas devido à grande tragédia que atingiu a Catedral de Notre Dame e acabou com boa parte de sua estrutura original; parte do horror causado pela cena também se deve ao medo do pós-vida e o temor exagerado da punição, um terror inerente a quase todas as pessoas.




10-O Poço dos Mortos de Hades – Hércules (1997).



Como você percebeu na adaptação do Corcunda de Notre Dame, nós podemos contar a mesma história de diversas formas, com personagens idênticos e usando de poucas mudanças significativas. Essas mudanças costumam ocorrer com mais frequência quando a obra será adaptada ao público infantil, eliminando aspectos como sexualidade e violência exagerada. Nem mesmo as adaptações de histórias da mitologia se escapam de alterações em seus enredos, como é o caso de Hércules.
O Hércules da Disney talvez seja a mais suavizada das adaptações do herói grego. Apenas para dar alguns exemplos, o herói não tem nenhuma rusga com Hera (o ponto mais importante da lenda), e também não matou a mulher e os próprios filhos após ser enfeitiçado por sua grande inimiga. Felizmente, essas mudanças não prejudicam da trama, e posso afirmar que Hércules é um dos melhores filmes da chamada “Renascença” da Disney que inclui os filmes da Pequena Sereia até o Tarzan.
Apesar do conteúdo aliviado na história, existem algumas cenas mais assustadoras em Hércules, como o ataque da Hidra e o despertar dos Titãs aprisionados por Zeus no passado. Nenhuma delas se compara com a luta final do herói no poço das almas de Hades, onde o grande desafio enfrentado por ele foi a própria morte; para um semideus, a expectativa do fim talvez seja mais horripilante em comparação com um humano mortal.
Para salvar Megara do submundo, Hércules teve de pular no Estige, o Rio dos Mortos, e os efeitos de sua passagem por ele incluíam um envelhecimento súbito, a olhos vistos. A cena é tensa de se ver, até porque as Moiras estão de olho no herói, preparado o fio da vida dele para o corte... Felizmente, ele consegue alcançar Megara a tempo, e esse gesto heroico resultaria em sua ascensão ao reino dos Deuses.



https://www.youtube.com/watch?v=Ts_WDlgNMoo



Texto escrito por Mateus Ernani Heinzmann Bulow. 

*Mateus, o escritor da postagem, é colunista do blogue da Taty Casarino há sete anos. Ele escreve sobre curiosidades históricas, universo fantástico e faz diversas listas com análises culturais e resenhas literárias. Sua parceria com o blogue de Taty Casarino só cresce e atrai cada dia mais leitores. 

*Mateus é gaúcho, da cidade de Santa Maria/RS, Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA), escritor e poeta. Mateus tem dois livros publicados: "Taquarê -- Entre a Selva e o Mar" e "Taquarê -- Entre um Império e um Reino". 

*Imagens dos livros do nosso colunista Mateus:


Link do livro no Skoob:


Sobre o livro:



Sobre o segundo livro:




*Se você gostou desse texto, confira outros textos do colunista Mateus:

*10 Lenas Urbanas da Disney:

http://tatycasarino.blogspot.com/2018/10/10-lendas-urbanas-da-disney.html

*10 Games da Disney:

http://tatycasarino.blogspot.com/2019/01/10-games-da-disney.html

*Confira todas as postagens do Mateus no blogue:

http://tatycasarino.blogspot.com/search/label/Mateus%20Ernani%20Heinzmann%20Bulow


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