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segunda-feira, 4 de julho de 2016

Das chamas do santuário





Mon amour, je veux ta douleur,
mon amour, je veux ta lumière,
mon amour, je t'aime beaucoup,

mon amour, je t'aime beaucoup.*

No leito de sua dor,
ela aparece de vestido negro,
beijando-lhe com ardor
e acariciando o seu peito.

Nada é tão justo como o escuro
que cobre, de noite, a nossa solidão.
Ela é a sua estrela de amor e paixão
nesse céu tão imenso e tão noturno.

A deusa que surge da lua negra
lambe a sua ferida e beija a sua tenda.
Há pés sobre os pés, poemas com beijos,
seios que formam o seu travesseiro.

Uma janela, um vitral, a lua cheia,
dois enamorados que se entregam
com devoção, fé e ardente oração
numa cabana que mais se aparece uma igreja.

Seria Ágape revestido de Eros
ou Eros revestido de Ágape?
Uma oração feita através de um enlace,
um enlace de paixão e disfarce.

A devoção da deusa é pura e farta
sem vaidade, sem ego, sem compaixão,
mas com cores, com frutos e com paixão.
Há amor de graça e não piedade falsa.

Se tiveres sede, ela não te dará um copo d'água,
mas uma cachoeira de prazeres e graças.
Se tiveres dor, ela não te dará remédio,
mas, com o bálsamo do amor, ela curará o seu tédio.

Ela entra de véu negro na igreja,
posso ouvir o barulho do salto alto
quando ela caminha em direção ao santuário.
Enquanto ele retira o seu véu, ela o beija.

O véu caindo sobre as velas dos santos,
as chamas que se alastram pela igreja,
enquanto eles exalam um cântico profano
no ápice de uma paixão intensa.

Quando o profano tem a luz do que é santo,
podemos ouvir o doce canto dos anjos.
É como se fosse uma poesia pagã
cantada dentro de uma igreja cristã.

Das chamas do santuário,
é possível sentir a devoção de Maria
nos beijos e abraços de Madalena.
O amor é tão grande e as pedras tão pequenas.

God, please hear me.
God, hear my pagan poetry.
God, I see your face in his pain.
God, I see your love in his fire.*

Os lábios que estavam a rezar
vão à magia do amar e do beijar.
As mesmas mãos que, unidas, oram
conhecem as carícias e se provocam.

Eles estavam destinados a conhecer Eros
na busca pelos bálsamos do Ágape.
Da igreja, fizeram um profano mistério
e, do pecado, ergueram de amor um castelo.

Os beijos de amor sob o luar
tecem de excitação a filantropia,
transformando os sonhos de amar
em realidades angélicas e divinas.

Ele viu na face dela um anjo de luz,
um anjo enviado por Deus em seu trono.
Mas, como sua carne ainda se seduz,
sentiu, por ela, desejos incitados pelos demônio.

O amor deles é repleto e completo,
Eros revestidos de pássaro angélico.
Ele ama a sua alma, doce flor.
Aceite este cálice de devoção e dor.

God, please hear me.
God, hear my pagan poetry.
God, I see your face in his pain.
God, I see your love in his fire.*


Mon amour, je veux ta douleur,
mon amour, je veux ta lumière,
mon amour, je t'aime beaucoup,

mon amour, je t'aime beaucoup.*

Poesia escrita por Tatyana Casarino.

                   

  Esta poesia busca refletir acerca da sacralidade do profano. Sim, isso mesmo: a sacralidade do profano. Num mundo tão maniqueísta e (falso) moralista que divide tudo entre bem e mal, certo e errado, celestial e carnal, busco nesse poema unir os opostos. Há aqueles que veem Deus apenas na sua própria religião e o mal espalhado em tudo. Há quem diga que tudo é pecado, pois não consegue enxergar a verdadeira onisciência sagrada de Deus.
  Deus é absoluto. Sendo assim, sua luz preenche tudo. Há resquícios celestiais até mesmo no carnal. Há aqueles que veem o diabo em tudo. Eu, no entanto, vejo Deus em tudo. O mal é apenas a ausência do bem. É preciso ressaltar que o Amor cobre uma multidão de pecados. Precisamos tornar sagrado tudo o que é humano, inclusive a simplicidade do dia a dia.
  Enquanto acharmos que Deus está distante de nós e que nossa conexão com Ele termina quando atravessamos a rua e deixamos a igreja para trás após a missa do domingo, estaremos equivocados e distantes da autêntica espiritualidade. Precisamos trazer Deus para dentro de nós e tornar sagrado o dia a dia.

                  
  
    Somente estaremos conectados verdadeiramente com Deus quando conseguirmos ver a sua luz e sua magnificência em tudo: na nossa família, nos nossos estudos, no nosso trabalho, no nosso andar, no nosso enxergar, no nosso ouvir, no nosso sentir, no nosso falar, na nossa vida material e até mesmo nas nossas refeições e nas relações sexuais.
   Quem disse que Deus se manifesta apenas no jejum, na castidade e no ascetismo? A abstenção de prazeres e até do conforto material pode ser útil por um tempo durante a jornada do autoconhecimento e do aprendizado da conexão com Deus. Tal abstenção aperfeiçoa o caráter, ensina-nos a ter humildade, solidariedade, silêncio interior, lucidez e temperança. Todavia, uma vez que essas lições são aprendidas, não há problema algum em termos uma vida humana comum, gozando dos prazeres terrenos com responsabilidade, amabilidade e caráter.
   Feliz daquele que consegue expressar a sua espiritualidade em atitudes na vida humana e não se torna hipócrita por cair em contradições entre o que faz e o que acredita. Precisamos de uma revolução moral, espiritual e psíquica. E tal revolução somente será realizada se empenharmos o nosso espírito na construção de uma vida humana que seja um perfeito espelho da vida espiritual.    

          
   
      Se acreditarmos que tudo o que é humano é pecaminoso, cairemos em abismos profundos. Nesse caso, tudo ficará vazio e pecaminoso mesmo. Se acharmos que dinheiro e sexo são pecados, a relação entre esses elementos e o ser humano tonar-se-á mais equivocada ainda, kármica e repleta de corrupção e pornografia. Se tratássemos o sexo e o dinheiro com amor, vendo neles a possibilidade de concretização terrena das aspirações humanas, tudo seria mais natural, verdadeiro, honesto, divino e amoroso. Somos feitos consoante a imagem de Deus. Logo, o que é humano também é sagrado. Quem foi que disse que tudo o que é humano é pecado?
    Vivemos uma era de vacuidade em todos os sentidos. Há muita ostentação e pouca essência. O dinheiro, ao invés de ser canalizado para a construção de boas obras e legados terrenos, é cada vez mais desviado, mal usado e desperdiçado. O sexo, ao invés de ser vivido como uma experiência de prazer verdadeiro, plenitude e transcendência onde a alma e a carne se unem por Amor e luz, acaba sendo temática de filmes com prazeres fingidos e falsas belezas ou virando (perigosamente) uma válvula de escape viciosa. Que mundo é esse onde a plenitude e a felicidade divina são esquecidas?
    Não podemos reprimir nossos desejos carnais e nosso temperamento. A repressão gera, paradoxalmente, o crescimento de nossos vícios, tendências e afetos. Tudo o que precisamos é de responsabilidade. Necessitamos de equilíbrio entre o espiritual e o humano. A temperança é muito mais importante do que o ascetismo propriamente dito!
    Portanto, "Das chamas do santuário" mescla o elemento sagrado e o elemento passional de forma poética para lembrar a todos que o "santuário" também pode ser invadido pelas chamas humanas sem perder a sua sacralidade natural. ;)

                 
   
     Metaforicamente, porém, trata-se de jovens amantes que vivem um amor proibido, onde a mulher que seduz o homem também representa uma espécie de guia espiritual para ele. Nesse sentido, os arquétipos de Maria (devoção e iluminação) e Madalena (pecado e paixão) são unidos em uma mesma mulher. Seria ela um anjo por guiar um homem sedento de luz? Ou seria ela uma pecadora por seduzir um homem que já carrega tantas dores? Essa mulher representa a luz ou a ilusão? O pecado ou a iluminação? Será que ela pode representar isso tudo ao mesmo tempo?
           
         

    De qualquer forma, o elemento feminino sempre será alvo da fascinação da humanidade. Há que diga que isso é ruim, pois oprime a humanidade da mulher quando ela é considerada uma bruxa ou uma deusa. Eu confesso que considero muito charmoso o fato de a mulher provocar essa fascinação. Eu desconfio que tal fascinação decorre de que nós mulheres estamos mais próximas do mundo astral (tanto do ponto astral do inferno quanto do paraíso hehehe). Nós carregamos a chave do outro mundo. Nós deixamos mais sensíveis as lógicas masculinas diante da vida terrena e conduzimos os homens para os pontos astrais (inferno e paraíso).
   O mundo gira em torno da mulher. Um sorriso de uma mulher conquista mais reinos do que mil guerras. Pode ser que oficialmente a sociedade tenha manifestações patriarcais. Mas, se olharmos com olhos mais profundos, veremos que a mulher sutilmente domina tudo. É lamentável que muitos ainda não perceberam isso...

Tatyana Casarino

**Traduções das estrofes em idiomas diferentes:


Mon amour, je veux ta douleur,
mon amour, je veux ta lumière,
mon amour, je t'aime beaucoup,

mon amour, je t'aime beaucoup. 

Do francês para o português:


Meu amor, eu quero a tua dor,

meu amor, eu quero a tua luz,
meu amor, eu te amo muito,
meu amor, eu te amo muito.    

   

God, please hear me.
God, hear my pagan poetry.
God, I see your face in his pain.
God, I see your love in his fire.


Do inglês para o português:


Deus, por favor, me ouça.

Deus, ouça minha poesia pagã.
Deus, eu vi a Sua face na dor dele.
Deus eu vi o Seu amor no fogo dele.







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