Olá, pessoal! Eu sou apaixonada por História há tempos, bem como amo Direito Constitucional. Sou Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA), Advogada e Especialista em Direito Constitucional pela Faculdade Damásio de Jesus.
Essa publicação foi feita por um amigo escritor, Bacharel em Direito e amante de História, Mateus Ernani Heinzmann Bülow. Como ele entende de História profundamente, combinamos que ele escreveria um texto sobre as dez constituições mais antigas que permanecem em vigor. O texto ficou maravilhoso e incrivelmente enriquecedor tanto do ponto de vista cultural quanto da perspectiva histórica e jurídica.
Particularmente, as histórias constitucionais que mais me chamaram a atenção foram a de Luxemburgo, Estados Unidos e San Marino. E você, leitor? Qual é a sua história constitucional favorita? Qual é a sua Constituição predileta? Conte-nos após a leitura! Salienta-se que minha Constituição favorita é a brasileira apesar de todas as críticas quanto ao nosso sistema jurídico, da atuação polêmica do nosso Supremo Tribunal Federal e dos dissabores quanto à (in)eficácia de algumas normais constitucionais. Boa leitura!
10 Constituições Antigas que continuam em Vigor.
Em 2018, a
Constituição Federal do Brasil completou trinta anos de existência. A CF/88 é a
oitava lei fundamental a vigorar em terras brasileiras, desde a independência,
seguindo uma longa e tortuosa história de instabilidade, acompanhando doses
generosas de progresso. Apesar de jovem, nossa constituição de 1988 é mais
velha e durável em comparação com as leis fundamentais de outros países, tais
como o Afeganistão (2004), Andorra (1993), Benin (1990), Mongólia (1992), Venezuela
(1998), entre outros.
Qual seria o
“prazo de validade” de uma constituição? Essa pergunta era realizada desde os
primórdios do constitucionalismo, ocorrido na passagem da Idade Moderna à Era
Contemporânea. Há relatos de que Thomas Jefferson, o principal autor da
Declaração de Independência dos Estados Unidos, teria dito (com certo exagero,
obviamente) que as constituições necessitavam substituição de quinze em quinze
anos. Entretanto, algo resistente à passagem do tempo, se adaptando às mudanças
na sociedade, é sempre digno de nota, sobretudo uma constituição.
Foi pensando
nessas “heroínas da resistência” que fiz essa lista, contendo as dez leis
fundamentais mais antigas que ainda se encontram em vigor, todas anteriores ao
Século XX. Deve se frisar que algumas delas não estão livres de críticas,
especialmente sobre o verdadeiro caráter delas, se são constituições legítimas
ou meros arremedos elevados à categoria de leis fundamentais. Boa leitura!
10-Tonga (1875).
À primeira vista,
esse pequeno reino no Oceano Pacífico não difere de outras nações e
dependências nas Ilhas Polinésias. Entretanto, Tonga possui uma história
deveras interessante: além de nunca ter sido uma colônia de países europeus ou
dos EUA, essa minúscula nação composta de 177 ilhas foi a primeira entidade na
região a contar com uma constituição, da qual nunca se desfez.
Tonga surgiria
como nação após uma série de batalhas e alianças conduzidas por George Tupou I,
em uma odisseia que terminaria em 1852, com a derrota do último líder tribal
independente. O reinado de George Tupou I, entretanto, não seria focado apenas
em guerras: em 1835, o monarca aboliu a servidão em territórios
recém-conquistados, e em 1838 foi criado o Código de Vava’u, o primeiro
conjunto de leis escritas no arquipélago, e fortemente influenciado pela fé
Metodista, à qual o rei havia se convertido.
Em 1850, um
segundo código foi anexado ao Código de Vava’u, proibindo a venda de terras em
Tonga aos estrangeiros. Esse arranjo daria origem à atual constituição do país,
em 1875, dividida em três partes, sobre os direitos e deveres dos cidadãos,
indo à estrutura do governo e terminando com disposições quanto à posse de
terras, bem como sucessão e venda das mesmas. Em 2010, uma reforma
constitucional reduziria as atribuições do monarca, passando muitas delas ao
primeiro ministro; dessa forma, Tonga deixou oficialmente de ser uma monarquia
absolutista, assumindo caráter constitucional.
9-Luxemburgo (1868).
O território do
atual Grão Ducado de Luxemburgo passou por diversas transformações desde sua
origem, como um simples condado medieval, e a atual denominação como Grão-Ducado
apenas seria adotada após o Congresso de Viena, em 1815. Nesse processo, muito
de seu antigo território se perdeu para os países vizinhos, especialmente para
a França, a Bélgica e a Alemanha.
Em 17 de Outubro
de 1868, uma emenda alterou radicalmente a lei fundamental do pequeno país,
datada de 1841, praticamente criando uma nova constituição. Curiosamente, a
emenda da de 1868 é tratada pelos constitucionalistas e historiadores
luxemburgueses como uma constituição nova, distinta em comparação com a anterior.
Em 1919, outra emenda transformou Luxemburgo em uma monarquia constitucional,
deixando ao Grão-Duque apenas as atribuições de comandante das forças armadas e
também para assinar tratados, desde que estes não fossem secretos.
Luxemburgo é um
dos menores países da Europa, mas seu reduzido tamanho é compensado por
diversos aspectos únicos: sua capital, cujo nome compartilha o do país, é uma
das três “capitais” da União Europeia, ao lado de Bruxelas na Bélgica, e
Estrasburgo na França. O país também é sede da Corte Europeia de Justiça, desde
1952, bem como o Tribunal de Contas Europeu, desde 1977, além de outros órgãos,
tais como o Secretariado do Parlamento Europeu, o Banco e o Fundo de
Investimento Europeu, e o Mecanismo Europeu de Estabilidade.
8-Canadá (1867).
Saindo de nações
minúsculas, passaremos pelo segundo maior país do mundo, e fruto de uma das
colonizações mais pitorescas da história, compartilhando franceses e ingleses.
O constitucionalismo canadense é fruto direto da Revolução Americana e das
rebeliões de 1837 e 1838, onde colonos tentaram fazer uma república aos moldes
dos patriotas americanos, sem sucesso. Apesar da vitória governamental, as
autoridades britânicas reconheciam que mais guerras surgiriam no horizonte,
exceto se um relativo grau de autonomia fosse concedido às colônias, de forma
ponderada e gradual.
A ideia de
unificar os assentamentos britânicos ao norte dos Grandes Lagos não era nova, e
o medo de uma invasão americana apressou o processo, combinado à difusão do
republicanismo. Em 1864, diversos partidos políticos, outrora rivais, fizeram a
chamada “Grande Coalização”, a fim de unificar o Alto Canadá e o Baixo Canadá.
O ponto alto desse esforço conjunto foi a Convenção de Charlottetown, no mesmo
ano, onde se decidiu pela manutenção dos laços com a Grã-Bretanha e um sistema
bicameral.
O Ato
Constitucional de 1867 seria feito junto às eleições parlamentares do mesmo
ano, bem como a nomeação do primeiro ministro, o escocês John MacDonald,
criando a Confederação do Canadá, um domínio independente dentro do vasto
Império Britânico. No ano de 1931, com o Estatuto de Westminster, o Canadá seria
igualado ao Reino Unido na Commonwealth, juntamente da Austrália.
Em 1982, ocorreria
o último passo na independência plena do Canadá, com o fim das decisões do
parlamento britânico sobre o antigo domínio, sobrando apenas a monarquia
inglesa como laço entre os dois países. Apesar da surpreendente lentidão na
obtenção da independência plena do Canadá, considera-se o 1º de Julho de 1867 como
a data nacional fundadora do imenso e gelado país.
7-Argentina (1853).
Saindo do extremo
norte do Continente Americano e indo ao extremo sul, nós encontraremos a única
representante latino-americana dessa lista. A Argentina teve duas constituições
anteriores à atual, aprovadas em 1819 e 1826, mas nenhuma delas seria capaz de satisfazer
os dois bandos rivais mais fortes na política argentina, os Unitaristas e os
Federalistas. Durante a primeira metade do Século XIX, logo após a
independência, esses dois bandos travaram guerras civis violentas pelo poder.
A atual
constituição da Argentina é fruto de uma contenda que poria fim ao período de
guerras civis: em 1852, o ditador Juan Manuel de Rosas foi derrotado na batalha
de Monte Caseros por uma formidável tropa de rebeldes argentinos, soldados
imperiais do Brasil e voluntários do Uruguai. Em 1853, um congresso na cidade
de Santa Fé capitaneado pelo jurista Juan Bautista Alberdi promulgou a nova
constituição.
A constituição de
1853 foi a primeira lei fundamental na Argentina a vigorar sobre todas as
províncias, e não apenas sobre Buenos Aires e províncias aliadas, além de
encerrar o ciclo de guerras e revoluções do início do Século XIX (embora
revoltas de menor poder destrutivo ainda ocorressem até 1880). A inspiração
dessa lei fundamental foi o liberalismo clássico, bem como a constituição dos
Estados Unidos da América, oferecendo grande autonomia às províncias e divisão
de poderes com um poder executivo forte, porém limitado por um parlamento
bicameral.
Apesar de resistir
à passagem do tempo, bem como aos golpes de estado sofridos pela Argentina no
Século XX, a constituição de 1853 não se manteve imutável. Já em 1860, foi
realizada a primeira das seis reformas, sendo que a última delas é de 1994.
Essas mudanças frequentes causam certa confusão entre os leigos e até alguns
estudiosos da área, acreditando que cada reforma constitucional equivale a uma
lei fundamental nova. Vez ou outra é possível ver um órgão de imprensa no Brasil
falando na “atual constituição argentina, de 1994”.
6-Dinamarca (1849).
Durante a era
medieval e a Idade Moderna, os reis da Dinamarca se submetiam a um documento
chamado Haandfaestning, cuja tradução literal seria “O Atador de Mãos”. Considerado
por muitos historiadores como o equivalente nórdico da Magna Carta dos
ingleses, o Haandfaestning compunha o único conjunto permanente de leis
escritas da Dinamarca, até sua abolição em 1665, por Frederick III, recriando o
absolutismo no pequeno reino; na prática, entretanto, o poder da coroa
repousava em uma série de concessões dos monarcas à alta e à baixa nobreza.
O caminho para uma
constituição seria pavimentado pelo medo das revoluções de 1848, responsáveis
por sacudirem o Velho Continente. Frederick VII seria coroado nessas
circunstâncias, e apesar de fazer parte da “linha dura” do Absolutismo, o novo
rei estava disposto a firmar acordos e concessões com os liberais e os líderes
campesinos, duas forças políticas que ficaram mais fortes no parlamento.
A assembleia
constituinte de 1849 coincidiria com a chamada Primeira Guerra de Schleswig
contra a Confederação Alemã, e Frederick VII se revezava entre esses dois
assuntos de relevância nacional. A nova lei fundamental continha diversos
aspectos inspirados na constituição da Noruega, de 1814 (falaremos nela também,
fique atento), e sua aprovação terminaria com a assinatura de Frederick VII, em
cinco de Junho do mesmo ano. Essa é a razão para essa lei fundamental ser
chamada “Constituição de Junho”.
Um detalhe digno
de nota da constituição de 1849 é a presença de um parlamento bicameral,
chamado Rigsdagen. O Rigsdagen era dividido em duas casas, a Landsting e a
Folketing, representando o alto e o baixo clero parlamentar, respectivamente.
Com o referendo constitucional de 1953, ambas as casas foram unificadas em um
parlamento unicameral, e a sucessão ao trono da Dinamarca passou a permitir a
ascensão das mulheres, embora ainda ocorresse a preferência aos integrantes
masculinos na família real, ao menos até o referendo de 2009.
5-Bélgica (1831).
Com o Congresso de
Viena e a derrota de Napoleão Bonaparte, diversas fronteiras novas surgiram na
Europa, bem como novos países. Uma dessas novas nações era conhecida como
Províncias Unidas dos Países Baixos, juntando a Holanda com diversos ducados e
principados ao sul, falantes de francês e flamengo, um dialeto local. Não
demoraria até a supremacia holandesa causar forte ressentimento nas províncias
sulistas, temperado pelas diferenças linguísticas e regionais.
Em 1830, esse
frágil arranjo seria desafiado por uma revolta nas províncias ao sul, uma das
muitas revoluções europeias daquele mesmo ano, e apesar da promessa de outros
países de ajudarem a Holanda, estes pouco puderam fazer, diante de rebeliões em
suas próprias fronteiras. A guerra de independência terminaria em 21 de Julho
de 1831, com a ascensão de Leopoldo I ao trono belga, afastando os anseios
unionistas holandeses.
Cinco dias depois
da coroação de Leopoldo I, a primeira constituição da Bélgica entrou em vigor,
seguindo um esboço planejado no ano anterior e levado à aprovação em um
congresso realizado em sete de fevereiro de 1831. Essa lei fundamental acumulava
aspectos da constituição dos EUA, bem como de duas constituições francesas, de
1791 e 1814, além de algumas leis inglesas (vale lembrar que o Reino Unido até
hoje não possui constituição, ao menos não formalmente).
A constituição
belga de 1831 estabeleceu a monarquia parlamentar como forma de governo e um
estado unitário centralizado; entretanto, as reformas de 1970 transformariam a
Bélgica em estado federado, em um reflexo das diferenças culturais acentuadas
entre os falantes de francês e flamengo. Desde 1967, existe uma versão em
holandês da constituição, e em 1991, a lei fundamental ganhou sua primeira
tradução para o alemão.
4-Holanda (1815).
É até irônico que
a próxima constituição da lista pertença à grande rival da Bélgica, mas a história
diferenciada da Holanda pode elucidar alguns detalhes curiosos. A primeira lei
fundamental a vigorar nos Países Baixos data de 1579, fortalecida com a União
de Utrecht. Essa mesma união de sete províncias criaria a república holandesa,
uma das poucas repúblicas em uma Europa repleta de monarquias. Outras
constituições surgiriam em 1794 e 1798, impostas à força pelos franceses de
Napoleão Bonaparte; a Holanda apenas recuperaria a plena independência em 1815.
Após a expulsão
dos franceses, um principado foi proclamado na Holanda, e em 24 de agosto de
1815, o novo rei, Wilhelm I, proclamou a nova constituição das Províncias
Unidas dos Países Baixos; essa constituição contava com uma declaração de
direitos, com liberdade de expressão, respeito ao Habeas Corpus, direito de
petição e liberdade de imprensa como pontos fundamentais. A promulgação foi
realizada por 55 parlamentares das províncias do norte, mas a carta foi
rejeitada pela maioria dos parlamentares vindos das províncias mais ao sul, já
revelando a cisma que daria origem à independência da Bélgica.
A primeira revisão
da constituição da Holanda ocorreu já em 1848, motivada pelas revoluções do
mesmo ano, estabelecendo a monarquia parlamentar em caráter definitivo. Essa
mesma revisão, às vezes descrita erroneamente como a versão original da
constituição holandesa, trazia a expansão do direito ao sufrágio, liberdade de
assembleia, privacidade da correspondência, ampliação da liberdade religiosa e
também a liberdade de ensino.
Revisões subsequentes
ocorreriam no Século XX, porém nenhuma delas seria tão relevante quanto a
revisão de 1983, onde a constituição foi quase totalmente reescrita, com
inúmeros artigos abolidos. Com essa revisão de 1983, direitos sociais foram
incluídos na constituição, enquanto a pena capital foi abolida, e
discriminações de qualquer espécie foram proibidas. A última revisão de maior
monta, embora não fosse a última a ser realizada, foi a de 1995, onde a
conscrição foi substituída por um exército profissional holandês.
3-Noruega (1814).
Durante
quatrocentos anos, a Noruega foi um reino dependente da Dinamarca, em uma
situação parecida com a do Canadá em relação ao Reino Unido: esse país nórdico
possuía exército, um parlamento relativamente autônomo, sistema legal próprio,
além de um governo composto por funcionários civis nascidos em seu território.
Em 1814, entretanto, esse reino dúplice foi desfeito pelo Tratado de Kiel,
outro acordo decorrente das guerras contra Napoleão Bonaparte; por esse
tratado, a Dinamarca seria obrigada a entregar a Noruega à Suécia, em
compensação pela perda da Finlândia para a Rússia.
A resposta
norueguesa aos novos suseranos foi rápida: em fevereiro do mesmo ano, os
noruegueses declararam independência e convidaram um herdeiro do trono
dinamarquês, Christian VII, para ser o novo rei. Em 1º de maio de 1814, o
jurista Christian Magnus Falsen apresentou uma constituição para o novo reino,
inspirada na lei fundamental dos EUA, na constituição francesa de 1791 e na
constituição da Espanha de 1812; esta lei fundamental seria aprovada no dia 16
do mesmo mês, considerado até hoje o Dia da Constituição, e feriado nacional na
Noruega.
Embora tudo
aparentasse correr bem aos noruegueses, a situação era desfavorável: poucos
países reconheceram o novo estado, e os suecos invadiram a fronteira oriental,
dispostos a esmagar o movimento independentista. A guerra teve triunfos e
derrotas para ambos os lados, mas os noruegueses sabiam da impossibilidade de
obterem uma vitória plena, por não contarem com mais recursos e soldados em comparação
com os suecos. Entretanto, a Suécia ainda se encontrava enfraquecida, devido à
guerra contra a Rússia em 1809, e também não desejava seguir em um conflito que
não acabaria tão cedo.
Temendo uma reação
ainda mais exaltada dos noruegueses, o rei sueco Karl XIII concordou em manter
a constituição de 1814 em vigor, após a Convenção de Moss. O Ato de União com a
Suécia foi negociado em 1815, com o primeiro-ministro Peder Anker liderando a
delegação norueguesa e buscando a maior autonomia possível em relação ao estado
vizinho, deixando apenas o rei e a política externa como assuntos a serem
tratados em conjunto entre os dois países. A independência plena da Noruega
seria obtida com um referendo em 1905, e o novo rei seria Haakon VII, mas a
constituição do novo reino continuaria a mesma, até hoje.
2-Estados Unidos da América (1788).
“We, the People”,
“Nós, o Povo”. Com essa frase singela começa o que provavelmente seja a lei
fundamental mais importante da história, responsável por influenciar diversos
constitucionalistas pelo mundo. Assim como boa parte das constituições nessa
lista, ela foi uma resposta ao autoritarismo, com destaque para as chamadas
“Leis Intoleráveis” de 1774, impostas pela coroa britânica em clara violação à
Declaração de Direitos de 1689, aprovada após a Guerra Civil Inglesa.
A aprovação da
constituição americana ocorreria durante a violenta guerra contra os
britânicos, por um governo provisório conhecido como “Congresso Continental”,
já em 1775; entretanto, a nova lei fundamental teria de esperar até 1781 para
entrar em vigor. Esse mesmo congresso seria responsável por organizar as
primeiras forças armadas permanentes dos EUA, convenientemente chamada
“Exército Continental”; apenas em 1796 esse exército provisório daria origem às
atuais forças armadas dos EUA.
Em seus sete
artigos, a constituição dos EUA carrega influência de diversos autores do
iluminismo, tais como John Locke, ao falar do respeito absoluto à propriedade
privada, e Montesquieu, na divisão dos três poderes. A adoração de uma parcela
considerável do povo americano em relação à sua lei fundamental, bem como à
Declaração de independência, é tão forte que alguns autores falam na existência
de uma “religião civil” baseada nas instituições mais antigas do país.
Desde a sua
entrada em vigor, a constituição americana foi emendada vinte e sete vezes. Em
1791, a Bill of Rights (Declaração de Direitos) adicionou dez emendas à
constituição, incluindo as famosas Primeira e Segunda emendas, responsáveis por
estabelecerem a liberdade de expressão e religião, bem como a posse irrestrita de
armas de fogo; as emendas da Bill of Rights às vezes são erroneamente descritas
como artigos da própria lei fundamental original. As dezessete emendas
seguintes expandiriam a proteção aos direitos civis (com destaque para a 13ª,
que aboliria a escravidão) e trariam novas garantias individuais, além de
modificarem procedimentos e processos administrativos.
1-San
Marino (1600).
E terminamos essa lista com uma representante pitoresca, vinda
de um país pitoresco, encravado na Península Itálica. Entretanto, para
conhecermos a constituição mais antiga do mundo ainda em uso, é preciso ver a
história do pequeno país, envolta em muitas lendas medievais e poucas certezas.
San Marino teria sido fundado em 301 Depois de Cristo, pelo santo de mesmo nome,
Marinus; esse mesmo santo foi o responsável por reerguer os muros de uma
cidadela na região, após um ataque de piratas.
São Marinus era um
dos muitos cristãos fugidos da perseguição do imperador romano Diocleciano, e
após se instalar no Monte Titano, ele e seus seguidores construíram uma pequena
igreja nos arredores, iniciando um período conhecido como “República Titana”,
possivelmente a mais antiga república do mundo ainda existente. O Papado
reconheceu a independência de San Marino em 1631, muitos anos depois da criação
de sua lei fundamental, e no Século XIX, a pequena república foi respeitada em
seu desejo de não se unir ao Reino da Itália, após a unificação.
Desde o Século
XVI, San Marino segue um conjunto de normas dividido em seis livros, baseados
no Corpus Juris Civilis e no Direito Romano. Sua condição de lei fundamental é
vista com desconfiança entre muitos historiadores da área, que preferem classificá-la
apenas como um conjunto de leis de caráter constitucional, mas estes compõem
uma minoria entre os estudiosos. Desde 1974, a constituição de San Marino adota
uma Declaração de Direitos, além de rechaçar abertamente a guerra de agressão.
Diferentemente de
outras repúblicas, San Marino é uma diarquia, comandada por dois
Capitães-Regentes nomeados a cada seis meses pelo parlamento, cada um deles
vindo de um partido político rival. O cargo de Capitão-Regente data do Século
XIII, e desde 1972 são aceitas mulheres entre seus integrantes, mas na prática
seu poder é mais simbólico do que real. Em 2002 foi estabelecido o Collegio
Garante della Costituzionalità delle Norme, que funciona como tribunal superior
ou corte constitucional, assumindo uma função até então reservada aos
Capitães-Regentes.
Texto escrito por Mateus Ernani Heinzmann Bülow.
*Mateus, o escritor da postagem, é gaúcho da cidade de Santa Maria/RS, Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Santa Maria (FADISMA), escritor, poeta e autor dos livros "Taquarê: Entre a Selva e o Mar" e "Taquarê: Entre um Império e um Reino".
Imagens dos livros citados:
*Link do primeiro livro de Mateus no Skoob:
*Confira todas as postagens do escritor no Blogue:
*Sobre o primeiro livro de Mateus:
*Sobre o segundo livro de Mateus:
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