O caderno digital de Tatyana Casarino. Aqui você encontrará textos e poesias repletos de profundidade com delicadeza.









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sábado, 8 de setembro de 2018

10 Casais da Realeza.



                   
   

       Olá, pessoal! Hoje eu trago mais uma postagem repleta de conteúdo histórico e cultural escrita pelo meu amigo escritor Mateus Ernani Heinzmann Bulow. Trata-se de uma lista com 10 casais reais que marcaram a história mundial (e do Brasil também). 
  Meu amigo escritor, além de ser Bacharel em Direito, possui vasto conhecimento de História (minha matéria predileta nos tempos do colégio) e traz nesse texto informações que você, leitor, dificilmente encontraria em seu material didático ou nos livros de História comuns. 
    Algo que me chamou bastante atenção no texto foi o fato dos princípios de certos direitos das mulheres estarem presentes em tempos bem antigos da História (eles não nasceram repentinamente de "revoluções" ou do feminismo da idade contemporânea como ensinam os livros do ambiente acadêmico). Talvez as mulheres não foram tão oprimidas ou desconsideradas pelos tempos pretéritos de nossa História como afirmam alguns filósofos. 
     Não há dúvidas de que as mulheres sofreram várias violações de sua integridade física, psíquica e sexual ao longo da História, mas rainhas e imperatrizes poderosas também tiveram suas vozes respeitadas no passado e diversos direitos das mulheres já despontavam ainda que tímidos... 
      Gosto de ouvir contrapontos e ler diversas fontes históricas diferentes para evoluir os meus conceitos culturais. Confesso que já escrevi textos e até artigos científicos afirmando que as mulheres foram oprimidas no passado, porém hoje olho para a História como um panorama muito mais complexo (além de ter me decepcionado com o discurso feminista). 

                 

         

          A História não é uma linha do tempo clara e inequívoca, mas um mosaico complexo de avanços, retrocessos, guerras e paixões. E, por falar em guerras e paixões, as duas forças motrizes da sociedade, o texto abaixo evidencia bem como essas forças trabalharam lado ao lado em nossa História. Vale ressaltar que, no livro Por que a Guerra, Diálogos entre Einstein e Freud, já foi afirmado que Eros e Thanatos, os instintos de vida e morte respectivamente, guiam o ser humano. 
        Se está curioso para mergulhar em "Contos de Fadas" da realidade, leia o texto até o fim (garanto que você vai adorar cada detalhe e enriquecer o seu conhecimento de História).

10 Casais da Realeza.

                   



        Quando se fala a respeito dos casamentos em famílias reais, geralmente duas imagens aparecem na mente: a primeira é idealizada, baseada em histórias de contos de fadas, com os noivos felizes no altar. A segunda destaca o fato de estes casamentos serem arranjados entre famílias reais, não partindo da vontade dos noivos, muitas vezes condenados a conviverem ao lado de alguém com a qual não simpatizam (embora geralmente se enfatize mais a infelicidade da noiva que do noivo).
        Na verdade, os casamentos da realeza não diferem muito dos matrimônios “comuns”, com seus desafios, dificuldades e momentos que apenas o entendimento mútuo pode levar adiante. Não foram raros os exemplos de príncipes e princesas que começaram mal após o matrimônio, porém evoluíram de forma positiva, enquanto se conheciam melhor e aprendiam a lidar com suas diferenças, muitas vezes cobrindo os pontos deficientes um do outro.
        Uma prova do fascínio dos casamentos reais é bem recente: o leitor pode não ser um defensor da monarquia como forma de governo, mas certamente prestou atenção nos dois casamentos reais mais recentes no Reino Unido, ou ao menos cruzou com notícias a respeito. Esses eventos da realeza são tão importantes que chegam a movimentar a economia britânica e impulsionar serviços em hotéis, com suas vagas prestes a serem ocupadas por visitantes ávidos pelas novidades na Família Real Britânica.
        Foi pensando nessas duas visões e na influência dos casamentos reais na história do mundo que fiz nessa lista, cuja realização deveria ter ocorrido por volta de junho, para acompanhar as festividades do Dia dos Namorados, no entanto foi substituída pelos 10 Casais da Mitologia. Aqui veremos monarcas de reinos rivais, alianças estratégicas e até alguns plebeus alcançando o trono enquanto lutam por seus amores. A lista também seguirá uma ordem cronológica, indo do início da Era Medieval até o final do Século XIX. Boa leitura!

1-Justiniano e Teodora.



          Nosso primeiro casal viveu nos primórdios do Império Bizantino, também chamado Império Romano do Oriente, e apesar de serem os governantes mais célebres da primeira grande nação cristã, ambos tiveram origens humildes: Justiniano era criador de porcos e Teodora era uma atriz de teatro em Constantinopla, a capital bizantina. O tio de Justiniano era um general chamado Justino (pouco criativos os nomes dessa família, hein?), e assumiu o controle do Império Bizantino, tornando-se o Basileus (Imperador). Nessa época, Justiniano e Teodora se encontravam com regularidade, e Justino revogou uma lei proibindo o matrimônio entre nobres e plebeus. Após a morte de seu tio, Justiniano assumiria o trono em 527.

        Justiniano e Teodora governariam juntos o Império, e a influência da Imperatriz era tão grande que ela possuía seu próprio selo, até então reservado apenas aos Basileus. Uma das maiores realizações de Justiniano durante esse período foi o Corpus Juris Civilis, que se tornaria a base do Direito e da jurisprudência latina, influenciando o Direito moderno. Um aspecto interessante do Corpus Juris Civilis era a atenção especial às mulheres, com penas mais severas para estupros e prostituição forçada, bem como a obrigatoriedade de deixar rés femininas sob a tutela de oficiais mulheres, para prevenir abusos.


                   

           O reinado de Justiniano foi recheado de guerras contra os Persas, os Vândalos e os Ostrogodos, porém nenhum desses conflitos foi tão perigoso quanto a Revolta de Nika, iniciada por uma briga de torcidas fanáticas durante uma corrida de carruagens (torcida organizada é sinônimo de encrenca desde sempre...). Incitados por senadores dispostos a derrubar Justiniano, os rebeldes exigiram a renúncia do Basileus, mas Teodora encorajou o esposo a resistir às massas, e em pouco tempo a revolta foi dissipada.
        Os últimos anos do reinado de Justiniano e Teodora seriam focados na administração do Império, com a construção da Igreja de Hagia Sofia (transformada em mesquita pelos turcos otomanos, em 1453) em Constantinopla, e a vistoria das atividades públicas e jurídicas, com vistas a combater a corrupção e a burocracia. Durante esse período, Teodora ficou célebre por libertar mulheres escravizadas em províncias afastadas ao pagar resgates, e ainda foi capaz de instruir essas prisioneiras a buscarem seu próprio sustento. Algumas até virariam monjas.
        A causa da morte de Teodora aos 48 anos de idade nunca foi especificada, porém a suspeita mais comum entre os historiadores aponta para um câncer de mama. Justiniano morreria vinte anos depois, transformado em um homem amargo, taciturno e profundamente religioso, marcado tanto pela morte da Imperatriz como por seus fracassos ao tentar reerguer a glória de Roma novamente. Assim como seu antecessor, Justiniano teria um sucessor em seu sobrinho, Justino II.

2-Harald Fairhair e Gyda Eiriksdatter.


            



      Seguindo até as terras geladas da Escandinávia, encontraremos um romance que daria origem a uma nação, mais precisamente a Noruega. Até o século IX, não existia uma Noruega unificada, e sim um grande número de reinos vikings independentes e desconfiados entre si, cuja fé oscilava entre os antigos cultos pagãos nórdicos e um tímido cristianismo nascente. As guerras entre esses reinos minúsculos ocorriam com frequência, bem como tênues alianças formadas por meio de matrimônios.

        Um desses reis se chamava Harald, líder da região de Vestfold. Após fazer um acordo com Eirik, o rei de Hordaland, Harald conheceu sua única filha, Gyda Eiriksdatter (literalmente, “Filha de Eirik”). O monarca de Vestfold logo se apaixonou por ela, com a intensidade e fervor da qual apenas os vikings são capazes... No entanto, a princesa afirmou que apenas se casaria quando Harald “se tornasse o rei de toda a Noruega”.


                  

      
          Em um misto de fúria e determinação, Harald fez uma dura promessa a si mesmo: ele não cortaria nem pentearia seus cabelos loiros, enquanto não derrubasse todos os reinos ao redor de Vestfold e se tornasse o único rei em pé. A partir de então, Harald seria conhecido como “Fairhair” (literalmente, “cabelos vastos”) por seus numerosos rivais, e estes logo aprenderiam a temê-lo em combate.
        O juramento levaria dez anos para ser cumprido, e o ápice dessa jornada ocorreu na batalha de Hafrjord, em 872, onde até Eirik lutou contra Harald Fairhair, sendo derrotado (não ficou bem claro se o sogro dele foi poupado ou morreu). Como prova do cumprimento de sua promessa, Harald finalmente cortou os cabelos e os enviou para Gyda, que concordou em se casar com ele.
        A veracidade dessa história de amor e violência é vista com grande desconfiança por muitos historiadores modernos, pois os relatos mais antigos de Harald e Gyda datam do século XII, trezentos anos após a unificação promovida pelo rei de cabelos compridos. No entanto, os noruegueses ainda consideram Harald Fairhair o herói fundador de seu país, e no local onde ocorreu a batalha decisiva de Hafrjord existe uma escultura de três espadas enormes em honra a este marco fundador.

3-Tamara da Geórgia e Davi Soslam.

            


       Seguindo ao Oriente Médio, chegaremos às montanhas do Cáucaso, um caldeirão fervente de culturas e fés. Durante o século XII, o reino da Geórgia era um enclave cristão cercado de reinos muçulmanos, governado por uma rainha dura, porém justa, chamada Tamara. Seu esposo era um general chamado Davi Soslam, e boa parte das conquistas do longo reinado de Tamara se devem a este estrategista e comandante.
        Davi seria o segundo esposo de Tamara, que já havia se casado com um príncipe chamado Yuri Bogolyubsky, vindo das terras geladas de Rus (atuais Rússia e Ucrânia). No entanto, ao descobrir uma intriga palaciana envolvendo Yuri, Tamara o expulsou da Geórgia. Davi foi reconhecido por sua liderança em batalha, e durante a tentativa de golpe movida por Yuri, sua participação foi decisiva ao comandar unidades avulsas do exército real georgiano contra as forças armadas privadas dos aristocratas que se uniram ao príncipe de Rus.

                       


          Em teoria, Davi e Tamara reinavam em conjunto, mas na prática o general ainda era um subordinado direto; no entanto, ele possuía grande influência sobre as decisões da rainha, estimulando-a a investir mais nas forças armadas, pois essa era a única forma do pequeno reino da Geórgia ser respeitado por seus vizinhos, maiores e mais populosos. Todas as campanhas contra os inimigos muçulmanos ocorreram sob a liderança de Davi, especialmente contra os turcos e os persas. Outro grande feito de Tamara e Davi foi o estabelecimento de reinos cristãos aliados na Armênia e em Trebizonda (norte da Turquia).

        O casamente de Tamara e Davi resultaria em dois filhos: um menino chamado Giorgi e uma menina com o nome de Rusudan. Davi Soslam faleceria subitamente em 1207, após outra guerra bem sucedida contra os turcos ao sul, enquanto Tamara passaria seus últimos anos governando ao lado do filho, até morrer em 1213. Desde aquela época, os russos contavam histórias sobre uma rainha guerreira cristã, vencedora de muitas guerras contra os persas, os turcos e os bizantinos.
         O reino da Geórgia teria mais alguns anos tranquilos, até uma devastadora série de invasões mongóis, dividindo a nação em vários reinos e principados independentes até a anexação pela Rússia no século XIX, e a independência plena viria apenas com o fim da União Soviética, em 1991. Curiosamente, a monarquia possui grande estima entre a população georgiana atual, e muitos cidadãos são favoráveis ao seu retorno, apesar do longo período sob a república (ou talvez justamente por isso...). Os herdeiros imediatos do trono georgiano são descendentes diretos da dinastia Bagrationi, a mesma da qual Tamara fazia parte.

4-Temudjin (Genghis Khan) e Börte.



       Indo mais ao leste, encontraremos uma terra inóspita, fria e dura, habitada por um povo rude e igualmente duro: os nômades mongóis. Quem poderia imaginar que uma longa história de amor e fúria daria origem a um dos maiores impérios da história da humanidade (duas vezes o tamanho do Brasil!), construído durante o reinado de apenas um homem? Temudjin, o futuro Genghis Khan, nasceu em uma época recheada de conflitos, onde os mongóis estavam divididos em um mosaico de tribos e clãs rivais.
        Quando tinha nove anos, Temudjin e seu pai, Yesugei, foram ao clã Merkita para escolherem uma esposa. No caminho, eles pernoitaram no acampamento de um clã aliado chamado Onggirat, e Temudjin se apaixonou por Börte. O menino pediu ao pai para praticar a escolha de esposas ali, mas ao invés de apenas praticar a escolha, escolheu oficialmente Börte como sua noiva. No retorno, Yesugei, foi envenenado por membros da tribo dos tártaros.

          


          Depois de casar-se com Börte, Temudjin seguiu com ela por um caminho incerto, até que um dia os dois foram encontrados por um grupo de merkitas comandados por Chitedu, desejoso da esposa de Temudjin como vingança por uma ofensa antiga de Yesugei. Temudjin reuniu alguns homens e foi até Jamukha, um amigo de infância que mais tarde se tornaria seu maior rival (para saber mais sobre Jamukha, leia o texto “10 Governantes Tirânicos que dariam Bons Vilões da Literatura”, feito pelo mesmo autor), para resgatarem sua esposa.

        Após o duro combate com os Merkitas, Temudjin consegue resgatar Börte, porém ela engravidou de um captor. Ao invés de matar a criança, como era o “habitual” nas estepes, o rude guerreiro decide assumir o menino, que ganha o nome de Jochi. Apesar da nossa visão tradicional (não totalmente errada, é verdade...) de Genghis Khan como um monstro brutal e sanguinário, ele estipularia muitas mudanças benéficas para o seu povo, proibindo sequestros de mulheres, como ocorreu com sua mãe e com Börte, e assassinatos de recém-nascidos nascidos fora dos clãs.
        A cada vitória dos mongóis, Genghis Khan expandia seu império e formava alianças com outras nações por meio de casamentos. No auge do Império Mongol, o Grande Khan possuía cinquenta mulheres, vindas de lugares tão distantes quanto a China, a Coreia e a Pérsia, e sua descendência se espalhou pela Ásia e Europa: hoje, um em cada duzentos humanos descende diretamente de sua linhagem. No entanto, Genghis Khan nunca permitiu outra mulher tomar o lugar de Börte, tanto na sua condição de imperatriz dos mongóis como em seu coração, e ela sempre ficava responsável pelo trono quando o imperador mongol partia em suas campanhas.

Obs: a primeira imagem faz parte de um filme chamado “Mongol”, produzido na Rússia, em 2007. Esse filme trata do início da vida de Temudjin e sua ascensão como Genghis Khan.

5-Hongwu e Ma Xiuying.



            Seguindo com a lista, vamos para o outro lado da Grande Muralha, na China, onde outro líder improvável fundaria outro império improvável, porém majestoso, com ajuda de uma mulher determinada e de pulso firme. Os últimos anos do domínio mongol na China seriam marcados pela ascensão de Zhu Yuanzhang, o futuro imperador Hongwu, criador da Dinastia Ming, uma das casas reais mais poderosas da China. Não à toa, “Ming” em chinês significa “Brilhante”.

        Zhu era o filho caçula de uma família de agricultores pobres, e viu seus pais e irmãos morrerem de fome, com exceção de um único irmão. Para sobreviver, Zhu virou noviço em um mosteiro budista, aprendendo a ler e escrever com os monges nesse período. Essa relativa estabilidade não duraria muito tempo, pois o monastério seria destruído durante um ataque mongol. Enfurecido, Zhu se juntou a um dos muitos bandos rebeldes chineses, e logo virou um dos comandantes mais capacitados; foi durante esse período que ele conheceu Ma Xiuying, filha de uma família de agricultores empobrecidos, assim como ele havia sido.

            


        Durante a guerra de independência chinesa contra os mongóis, Zhu teve de se ocupar com outros desafios: bandidos, piratas, fome, pestilência e grupos rivais dispostos a fundarem suas próprias dinastias. Nesse período ele declarou a si mesmo como o imperador Hongwu (“Estrito Valor Marcial”, em chinês), e Ma Xiuying se tornou imperatriz. Apesar dessa ascensão, os fundadores da Dinastia Ming mantiveram seus hábitos simples, e enquanto Hongwu se envolvia com a guerra, Ma Xiuying era responsável pelo “setor de contabilidade” do exército Ming, além de oferecer apoio moral e religioso às famílias dos soldados.
        Apesar de não apreciar as intervenções de sua mulher na política, Hongwu respeitava suas decisões e muitas vezes as seguia sem hesitar. A construção de silos para o inverno, por exemplo, partiria de uma sugestão de Ma Xiuying, bem como diversas melhorias para os agricultores, com direito até mesmo a uma “reforma agrária”. Como Hongwu e Ma Xiuying conheceram de perto as dificuldades dos homens do campo e suas famílias, também faziam de tudo para tornar suas vidas mais dignas. Outro aspecto positivo da presença da imperatriz estava em “apagar o fogo” da fúria de Hongwu, habituado a matar funcionários públicos que falhavam com suas funções ou eram acusados de corrupção.
        O casal fundador da Dinastia Ming não teve filhos, então se dedicaram a criar os filhos de Hongwu com suas concubinas, para formarem uma sucessão estável; entretanto, Zhu Biao, o filho mais velho do imperador, morreria cedo. Em 1382, Ma Xiuying ficou doente, e sabendo que seu tempo estava se esgotando, deu uma série de conselhos para seu marido, suplicando-o para não deixar a raiva turvar suas decisões mais importantes, como ocorreu no passado. Hongwu reinaria sobre a China até 1398, sendo sucedido no trono por um neto chamado Jianwen, filho de Zhu Biao.

6-Hayam Wuruk e Dyah Pitaloka Citraresmi.



      Seguindo ao sul da Ásia, chegaremos ao arquipélago malaio, o maior conjunto de ilhas do mundo. Ali encontraremos um romance que não chegaria a se concretizar, porém mudaria a história da região, e sua influência ainda se faz presente na atual Indonésia. Hayam Wuruk era o quarto monarca do Império Majapahit, uma nação fundada em 1293 e centrada na ilha de Java, cujo domínio se estendia sobre todas as ilhas da atual Indonésia. Muito desse vasto império foi conquistado sob a tutela de Gajah Mada, um ministro que havia servido os dois monarcas anteriores a Hayam Wuruk.
        Nascido em uma família humilde, Gajah Mada ascendeu rapidamente em diversos cargos do Império Majapahit, e se tornaria ministro por indicação da mãe de Hayam Wuruk, a rainha Tribhuwana; após sua nomeação, Gajah Mada fez um juramento, afirmando que não comeria frutas nem temperaria sua comida enquanto todo o arquipélago malaio não fosse unificado sob um único rei. Em dez anos, quase todas as ilhas obedeciam a Majapahit, faltando apenas um reino a ser dominado, chamado Sunda. Esse reino ocupava o ocidente da ilha de Java, a mesma ilha onde estava sediada Trowulan, a capital de Majapahit.

              


          As relações entre Sunda e Majapahit sempre foram tensas, porém Hayam Wuruk ofereceu uma oportunidade de paz em troca de um casamento. A noiva seria uma princesa chamada Dyah Pitaloka Citraresmi, filha do rei de Sunda, e quase toda a família real viajou até Trowulan para o casamento; como havia gente demais para abrigar no palácio, a família real sundanesa resolveu acampar em uma praça, chamada Bubat. Gajah Mada viu no evento uma oportunidade para transformar Sunda em um vassalo de Majapahit, e sugeriu que ao invés de rainha, Dyah se tornasse mais uma concubina no harém. Hayam Wuruk sentiu-se insultado com a proposta, e a conversa logo se espalhou no acampamento sundanês.
        Não demorou até a ocasião festiva se converter em batalha: percebendo sua honra ofendida, os nobres sundaneses, acompanhados de serventes e soldados, desembainharam suas espadas e entraram em conflito aberto com a guarda real de Majapahit. Apesar da desvantagem numérica, os sundaneses lutaram até o último homem, e as mulheres da família real se suicidaram ante a derrota inevitável, incluindo Dyah. Hayam Wuruk ficou inconsolável com a morte da princesa e condenou Gajah Mada ao exílio em uma ilha distante, para nunca mais voltar. O império seguiria bem até a morte de Hayam Wuruk, mas seus sucessores, filhos dele com uma concubina, iniciariam uma guerra civil que abalaria a base do vasto reinado. Em 1527, após nove reinados, Majapahit deixou de existir.
        O mais impressionante nesta triste história é que seus efeitos ainda são visíveis na Indonésia atual: Gajah Mada é considerado um grande herói na região, por ter unificado todo o arquipélago pela primeira vez na história, algo que não ocorreria novamente até a chegada dos colonizadores holandeses, e quase todas as cidades indonésias possuem uma avenida com seu nome (algo como as avenidas Presidente Vargas no Brasil). A única exceção está na cidade de Bandung, que foi capital de Sunda, onde a avenida principal leva o nome de Dyah Pitaloka Citraresmi, e nenhuma rua possui o nome do ministro. Como os sundaneses fazem parte de um grupo étnico diferente dos javaneses, essa tragédia também deu origem a uma lenda, afirmando que casamentos entre esses dois povos trazem azar.

7-Carlos I da Espanha e Isabel de Portugal.




             Voltando à Europa, encontramos duas potências emergentes do século XVI: Portugal e Espanha. A idade Média estava em seus derradeiros momentos e novas terras e impérios exóticos eram descobertos nas Américas e nas Índias. Foi nesse contexto que a família real de Habsburgo se faria proeminente na política europeia, e Carlos se tornaria o primeiro monarca de uma Espanha unificada, após o reinado de Fernando de Aragão e Isabel de Castela.
        A ascensão de Carlos ao trono espanhol ocorreria em 1519, mas seus primeiros anos de reinado não seriam fáceis: o primeiro rei da Espanha havia nascido na atual Holanda e sua cultura geral era alemã, bem como a língua, mal sabendo falar espanhol. Como seu avô era o Sacro Imperador Germânico Maximiliano I, Carlos necessitava governar não apenas a Espanha e suas colônias nascentes, como também os territórios da Alemanha e da Áustria, além de alguns ducados e principados nos Países Baixos e no sul da Itália. Para manter esse território imenso sob um razoável controle, Carlos aplicou um “proto-federalismo” em seu império, deixando a maior parte das competências sob administradores locais, com exceção das forças armadas e cobrança de tributos.

             


      Poucos anos após assumir o trono, Carlos receberia uma proposta de casamento: Manuel I de Portugal, o rei que iniciou a colonização do Brasil, ofereceu sua filha ao monarca espanhol. Os noivos se conheceram na cidade de Elvas, na fronteira das duas nações, e é dito que Carlos ficou deslumbrado ao ver Isabel cavalgando em sua direção, montada em uma égua branca. O monarca espanhol temia ser repelido, devido à sua aparência pouco atraente e com um queixo comprido, típico da família Habsburgo, enquanto Isabel, com seus cabelos loiros pendendo para o ruivo e olhos claros, era descrita como a mulher mais formosa da Europa. Apesar do arranjo político, o casamento foi feliz, e tanto marido como mulher dividiam as atribuições de governo.
        Carlos e Isabel coincidiam na devoção religiosa e no gosto pela leitura e artes. Quando o rei espanhol partia em campanha, sua esposa regia o governo, defendendo a autoridade real e agindo com mão firme sobre funcionários acusados de abuso e corrupção. Durante seu reinado, Carlos teve de lidar com a reforma protestante, disputas territoriais na Itália contra a França, a expansão otomana no Mar Mediterrâneo, revoltas internas na Espanha, e ainda proteger portos espanhóis de piratas (ufa!). Nessas longas ausências, Isabel e seu esposo se escreviam com regularidade, a cada vinte dias.
        Em 1539, Isabel morreria após um parto mal sucedido, com apenas trinta e cinco anos de idade, e Carlos sofreu muito com sua morte, não conseguindo sequer juntar coragem para acompanhar o cortejo fúnebre. O homem mais poderoso da Europa nunca se casaria novamente, e passaria o resto da vida vestindo apenas preto, demonstrando luto eterno. Após quarenta anos ocupando dois tronos, Carlos abdicou em benefício de seu irmão, Fernando I do Sacro Império Germânico, e de seu filho mais velho, Felipe II da Espanha. Devido à influência de sua mãe, Felipe se considerava espanhol e português ao mesmo tempo, e isto o motivaria a obter as coroas dos dois reinos, iniciando a União Ibérica.

Obs: as fotos fazem parte da série histórica espanhola “Carlos: Rey Emperador”. Essa série fala dos principais acontecimentos do reinado deste monarca, incluindo diversas cenas ao lado de Isabel de Portugal. Abaixo está uma cena reconstituindo a primeira ocasião em que se viram:


Carlos V y Isabel de Portugal se conocen 

Série TVE (Ótima série para treinar o espanhol e aumentar o conhecimento histórico ao mesmo tempo)


                       https://www.youtube.com/watch?v=zbxnuK4iVUw


8-Shah Jahan e Mumtaz Mahal.



      “Foi uma linda história de amor”, dizia a música Taj Mahal, de Jorge Ben Jor... E os próximos integrantes da lista são os personagens dessa música. Nossa próxima parada será a Índia, durante a era dourada de uma nação muçulmana conhecida como Império Mughal (esse país também é chamado “Mogol” em alguns livros, mas para evitar confusões com o Império Mongol, usarei o termo Mughal). Seu quinto imperador foi Shah Jahan, cujo nome significava “Soberano do Mundo”, um apelido obtido após muitas guerras contra reinos vizinhos.

        Quando tinha quinze anos, Shah Jahan foi prometido em casamento a uma menina de quatorze anos, chamada Arjumand Banu, filha de um vizir (cargo equivalente a ministro em países islâmicos) de origem persa. Não demoraria até a princesa ser apelidada de Mumtaz Mahal, que significa “A Preferida do Palácio” em persa, pois apesar do imperador já possuir duas esposas anteriores, todos conseguiam perceber a preferência dele por Arjumand, ao ponto de nomeá-la Malika-i-Jahan, “Rainha do Mundo”.

                


      Durante o reinado de Shah Jahan, Mumtaz Mahal o acompanhava em suas campanhas militares nas fronteiras, apesar de estar grávida com frequência: ela pariu quatorze crianças durante os dezenove anos ao lado do líder Mughal. Sob a influência de sua favorita, Shah Jahan estabeleceria casas de auxílio e apoio para necessitados, incluindo feridos de guerra e viúvas (lembrando que o costume da viúva se atirar na pira funerária do marido ainda era forte na Índia, isso foi um grande avanço). Além dessas obras de assistência social, Mumtaz Mahal promoveu artistas e poetas, e costumava acompanhar o esposo quando ele assistia rinhas de elefante (eita!) e duelos de espada.
        A morte de sua favorita após o 14º parto foi um golpe tremendo para Shah Jahan, bem como para o Império Mughal. Embora o luto oficial tivesse durado um dia, o luto do líder Mughal durou um ano, e ao final deste período ele aparentava ter envelhecido uma década, com sua barba negra tornando-se branca como a neve das montanhas. O imperador Mughal não contava mais com a força de sua juventude, sua maior aliada nas campanhas militares, e a expansão do império freou temporariamente, retornando apenas com o reinado de seu terceiro filho com Mumtaz Mahal, Aurangzeb.
        A obra derradeira de Shah Jahan, cuja segunda grande paixão era a arquitetura, seria o Taj Mahal, um formidável mausoléu onde Mumtaz Mahal repousaria. A obra levaria vinte e dois anos, e em 1657, o imperador Mughal caiu doente, enquanto seus filhos sobreviventes brigavam pelo trono. O vencedor da contenda seria Aurangzeb, que apesar de partilhar do talento militar de seu pai, não era tolerante com os hindus, e após sua morte o Império Mughal entrou em declínio. De certa forma, o custo exorbitante do Taj Mahal também esgotou as finanças do país, mas hoje o turismo em volta do monumento movimenta uma quantia capaz de pagar trinta obras similares.

9-Vitória do Reino Unido e Albert de Saxe-Coteburg.



           Um ditado antigo afirma que “por trás de um grande homem, existe uma grande mulher”; e o contrário também é verdadeiro no segundo reinado mais longevo do Reino Unido (apenas o reinado atual de Elisabeth II é mais longo). Praticamente todo o século XIX esteve sob a supremacia britânica, e de 1837 a 1901, Vitória reinou sobre a nação mais poderosa da terra. Apesar de não contar com o poder absolutista dos monarcas de antigamente, Vitória definitivamente influenciou a moral e os costumes ingleses, ao ponto de seu longo reinado ficar conhecido como a “Era Vitoriana”.
        Albert e Vitória estavam unidos pela ascendência germânica (ela foi a última monarca britânica da Casa de Hanover) e também pela idade, pois ambos nasceram em 1819. O príncipe alemão já despertava a atenção de Vitória, antes mesmo de se casarem, devido ao seu engajamento em causas como o acesso à educação para os mais humildes e a abolição da escravatura. Outros interesses de Albert eram ciências naturais e máquinas, isso em uma época que muitas figuras chaves do governo britânico acreditavam que o avanço científico “deturpariam a moral e os bons costumes”.

          


          Vitória já estava grávida em menos de dois meses após o casamento com Albert ser consumado, e essa união geraria nove crianças. Toda essa prole sobreviveria à idade adulta, um feito formidável para a época, e Albert ficou pessoalmente responsável pela educação dos príncipes e princesas, equilibrando a rigidez típica do Reino Unido com um lado lúdico (ele se encaixaria na descrição do “pai canceriano”, descrito no texto “O Pai de cada Signo”, também neste blog). Ironicamente, Vitória admitia não ter muito trato com crianças, chegando a declarar que bebês recém-nascidos mais pareciam “monstrinhos carecas”; o cuidado de Albert com crianças, ausente em Vitória, aumentaria sua influência nas decisões da rainha.
        Em todas as suas decisões, Vitória perguntou ao marido o que deveria ser feito. De certa forma, Albert seria fundamental no fortalecimento do modelo parlamentar britânico, persuadindo a rainha a ser menos agressiva ao defender seus posicionamentos e se ocupar de fortalecer ministros e parlamentares que coadunem com suas ideias. Em outras ocasiões, Albert não foi tão bem sucedido: o príncipe consorte discordava da política expansionista do Império Britânico, defendida por Lord Palmerston e Vitória. Durante o “Século Britânico”, o Reino Unido controlava direta ou indiretamente ¼ do globo terrestre.
        Em 1859, Albert ficou doente do estômago após cair de um cavalo em alta velocidade, mas continuou cumprindo suas funções públicas, apesar das dores horríveis. Esse calvário duraria até 1861, quando ele faleceu aos quarenta e dois anos, e desde então Vitória apenas usou preto, pouco aparecendo em público; a imagem da monarquia britânica ficou ameaçada e um incipiente movimento republicano surgiu no parlamento, obrigando-a a retornar ao público. Vitória encontraria algum conforto ao ver os filhos e netos formando suas próprias famílias ao redor da Europa, enquanto o prestígio da monarquia britânica se fortaleceria novamente na época de sua morte, em parte devido à imagem maternal da soberana idosa, apesar de Vitória nunca ter abraçado completamente a função de mãe.

10-Pedro II do Brasil e Teresa Cristina das Duas Sicílias.



     E encerraremos esta lista com dois monarcas brasileiros, cujas figuras perduram no imaginário popular, até hoje. Apesar de tecnicamente ser o imperador do Brasil aos cinco anos, após a renúncia de seu pai, Pedro II apenas assumiria suas funções no trono a partir de 1840, com o chamado golpe da maioridade.  Pedro II mostrou ser disciplinado e trabalhador nos seus primeiros anos de reinado, porém outra preocupação apareceu: era preciso assegurar a continuidade no trono. Como o Brasil era a única monarquia nas Américas, era preciso procurar uma noiva na Europa, e o mau exemplo de Pedro I e sua infidelidade ainda estava latente na memória das casas reais do continente.
        Após rodar a Europa em busca de uma noiva para Pedro, Bento da Silva Lisboa, o 2º Barão do Cairu, aceitou a proposta de Vicenzo Ramírez, embaixador das Duas Sicílias na Áustria. Com isto, Teresa Cristina se casaria com o jovem monarca. A princesa chegaria ao Brasil em 1843, e conta-se que Pedro II, até então animado para vê-la pessoalmente, ficou muito desapontado ao descobrir que a noiva não era tão bonita como supunha. Na primeira noite após o casamento, tanto Pedro como Teresa choraram: ele por se sentir enganado, e ela por temer ser repelida.

                


       Apesar do começo atribulado, a constância de Teresa para cumprir deveres, bem como o eventual nascimento de filhos, amoleceu a atitude de Pedro. Os dois descobriram interesses em comum, e suas preocupações e alegrias com os filhos criariam um sentimento de felicidade familiar. Teresa Cristina não tinha interesse em política, e se ocupava com projetos de caridade e funções religiosas. O que lhe faltava de boa aparência sobrava em canto: sua voz era muito bonita, e a imperatriz praticava canto regularmente. Não lhe faltavam interesses intelectuais e ela desenvolveu paixão pela arqueologia. A imperatriz também ajudou a recrutar médicos, professores, engenheiros, farmacêuticos, enfermeiras, e trabalhadores italianos qualificados, com o objetivo de melhorar a educação e saúde pública dos brasileiros.
        Estrangeiros que visitavam a família real comentavam com espanto que boa parte das refeições era feita por Teresa, sem ajuda de criadas. Como uma boa italiana, ela fazia massas com regularidade, além de canja de galinha, o prato preferido do Imperador. Uma lenda urbana afirma que a imperatriz teria inventado a coxinha de frango, comum nas lancherias hoje em dia, baseada em um salgadinho típico da Sicília, chamado arancino, feito com arroz frito e recheado com queijo e frango.
        Durante o reinado de Pedro II, Teresa Cristina acompanhou o esposo em algumas de suas viagens. Seu retorno à Sicília, entretanto, foi doloroso, pois a Itália recém foi unificada e a família dela foi destronada. Era um prenúncio do que estava por vir no Brasil: em 1889, um golpe militar derrubou a monarquia, e a família real foi obrigada a sair do país. No mesmo ano, Teresa Cristina faleceu, e dois anos depois, Pedro II também morreria. O imperador e a imperatriz receberam um local de descanso final na Catedral de Petrópolis, em 1939, e hoje seus descendentes vivem no Brasil. Um desses descendentes, o Príncipe Luiz Phillipe de Orleáns, quase foi o vice de Jair Messias Bolsonaro, um dos candidatos à presidência.


Texto escrito por Mateus Ernani Heinzmann Bulow. 

     


** O escritor da postagem é Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Santa Maria - RS (FADISMA), escritor, poeta e autor do Livro "Taquarê -- Entre a Selva e o Mar". Em Santa Maria, o livro do autor está disponível para compra nas seguintes livrarias -- Athena, CESMA e CAPOSM. 

        


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