A tragédia do Rei Gelado.
Ao longo da história, diversos personagens tidos como
sombrios e brutos revelaram seu caráter íntimo, mais suave, mas sufocado por
uma existência sofrida e um passado tortuoso. Exemplos não faltam: Fera, de “A
Bela e a Fera”, Quasimodo, de “O Corcunda de Notre Dame”, O Fantasma da
Ópera... Até mesmo nos quadrinhos vemos personagens inicialmente ameaçadores,
mas que logo revelam uma faceta interior até então desconhecida (caso do
Wolverine, dos “X-Men”, e do Conan, o Bárbaro).
O
personagem aqui tratado segue essa “tradição” do ser disforme com um bom
coração escondido sob uma aparência ameaçadora, mas na forma de desenho
animado. Trata-se do Rei Gelado, antagonista principal de “Hora de Aventura”.
Na trama, ele inicialmente é apresentado como um idoso rei solitário, obcecado
por sequestrar princesas, com o objetivo de se casar com uma delas. Seus
planos, entretanto, sempre são frustrados por Finn e Jake, protagonistas da
série, ou até mesmo pela sua própria personalidade atrapalhada.
Aparentemente, Rei Gelado
também busca por amigos para se divertir, e invariavelmente, o menino e o cão
se vêm envolvidos em suas tramas surreais, na tentativa desesperada de
conseguir amigos. O aparentemente incorrigível vilão não tem ideia de que sua
presença não é bem vista entre os habitantes do mundo onde vive. Em uma das
histórias ele fica observando os protagonistas à distância, tentando “aprender
a ser feliz”.
Com o tempo, o papel do Rei
gelado nas histórias vai se modificando, chegando a assumir até mesmo a função
de personagem-chave, como quando os três juntaram forças para vencer uma
entidade demoníaca chamada Lich, que almejava destruir o mundo.
Em um dos episódios mais
recentes, nos é revelada a origem do atrapalhado vilão: Ele era, originalmente,
um cientista que encontrou uma coroa amaldiçoada, e foi lentamente sendo
“contaminado” por sua influência. Nesse meio tempo, sua noiva, chamada por ele
de “minha princesa”, o abandonou. Daí se explica a espiral de loucura e solidão
que se tornou a vida dele. Perceba também como a ex-noiva dele lembra muito
fisicamente a Princesa Jujuba, seu principal alvo.
A solidão dele é tamanha, a
ponto de tentar satisfazer seu desejo de forma extremada: Criar sua própria
princesa, em uma paródia bem humorada de Frankenstein. O problema foi onde ele
conseguiu as “partes” necessárias ao seu intento... Interessante notar todo o
esforço e o carinho dispendidos pelo lunático soberano para que sua nova
“esposa” se sentisse bem com sua própria aparência (um casal que combina em
seus sofrimentos diários, não?).
Será possível um dia o Rei
gelado se livrar de seu tormento, e encontrar quem o ame, a despeito de sua aparência
e de sua personalidade? Seguindo o exemplo de outros personagens que causavam
repugnância, terror e desconfiança, mas que por meio de atitudes benevolentes
se tornaram bem aceitos, é bastante provável que ele alcance a sua redenção,
mas, convém lembrar, o caminho para alcançar o equilíbrio emocional e superar a
rejeição é longo e tortuoso, talvez levando uma vida inteira para se
concretizar.
E, como tudo o que nos rodeia, assim segue a vida, o
trajeto talhado de diferentes formas pelos humanos.
Texto concedido por: Mateus Ernani Heinzmann Bulow
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