Olá, leitores! Aqui é a poetisa Tatyana Casarino e hoje eu trago um texto escrito pelo meu amigo escritor Mateus Ernani Heinzmann Bulow que colabora gentilmente com o Recanto da Escritora. Vocês já assistiram ao filme Animais Fantásticos e Onde Habitam? Se você já assistiu, fique à vontade para comentar a respeito da análise feita pelo Mateus. Se você ainda não assistiu, fique tranquilo, pois o texto abaixo não contêm grandes revelações acerca do enredo.
O autor do texto destaca alguns pontos relevantes do filme com uma escrita requintada e divertida ao mesmo tempo. Espero que você, leitor, esteja pronto para viajar no tempo e passear em Nova York na década de 20. Pegue a sua maleta (talvez ela seja fantástica), aperte o cinto e mergulhe no texto do Mateus!
Animais Fantásticos e Onde
Habitam – Análise.
Entre dois mundos próximos,
porém distintos, os monstros estão à solta... E tudo se deve a um biólogo
trapalhão, um veterano de guerra sonhador e duas maletas trocadas. Assim começa
Animais Fantásticos e Onde Habitam, o nono filme baseado na franquia Harry
Potter (lembrando que o sétimo livro foi dividido em duas partes), e dessa vez
a trama segue ao passado, à América dos anos vinte, onde a dura realidade do
pós guerra e o preconceito lentamente se tornam uma ameaça para a segurança e a
estabilidade entre as dimensões dos humanos “comuns” e os bruxos.
O protagonista da história se chama Newt Scamander,
um estudioso de criaturas mágicas e monstros, cuja maleta é um verdadeiro
zoológico com os mais estranhos animais de todos os cantos do globo.
Atrapalhado como só um apaixonado por seu ofício consegue ser, Newt perde sua
maleta ao trombar com um veterano da Primeira Guerra Mundial chamado Jacob
Kowalski, e com isto o circo está armado: diversos monstros de variados
tamanhos e temperamentos estão soltos na “Big Apple”. Agora cabe a essa dupla,
acompanhada de uma bruxa investigadora com o curioso nome de Porpetina
Goldstein, recuperar todos os animais fantásticos, antes que estes causem mais
danos.
No entanto, os problemas não estão apenas nos bichos
fugitivos espalhados pela cidade: uma guerra silenciosa está prestes a começar,
instigada pelos lados mais radicais entre os bruxos e os trouxas (não-bruxos),
denominados como “No-Majs” nos Estados Unidos. Os protagonistas terão de lidar
com a desconfiança de outros investigadores, encontrar todas as criaturas, e
ainda evitar o contato com outros No-Majs em nome da segurança da comunidade
bruxa. E como tempo é artigo de luxo, vamos começar a análise!
Pontos positivos:
1 – Nova York, década de vinte.
Neste filme, nós saímos do interior da Inglaterra
para acompanhar a vida em uma das maiores metrópoles já criadas pelo homem, e
justamente em uma época dourada dessa cidade. Nova York e seus habitantes dos
“Roaring Twenties” (“Loucos anos vinte”) estão bem representados, tanto em suas
vestimentas como em seus costumes.
O mais interessante desta viagem no tempo está em ver
os próprios bruxos adotando tais costumes: o órgão investigativo americano
lembra muito o FBI dos filmes de gangster, e um dos bares frequentados pelos
personagens é mantido por duendes, com direito até a uma dançarina/cantora dessa
espécie. Chega a ser espantoso como o mundo bruxo, em nome de sua segurança,
adotou diversos costumes dos americanos para continuar nas sombras,
demonstrando o quanto uma cultura pode aprender com outra.
2 – Jacob e Queenie.
Chega a ser engraçado ver dois personagens
coadjuvantes ganhando destaque na análise do roteiro ao invés dos
protagonistas, mas existem razões para tal julgamento de minha parte. Newt e Porpetina
estão bem representados e é divertido vê-los trabalharem juntos, porém a cena é
roubada pelo aspirante a padeiro e a irmã mais nova da investigadora, talvez
por serem os maiores sonhadores do filme: Jacob apenas queria seguir um sonho
antigo de ser padeiro, após trabalhar em uma fábrica de enlatados. Queenie, por
sua vez, se pergunta quanto tempo levará até No-Majs e bruxos continuarem
desconfiados entre si.
Jacob de certa forma é um reflexo do público, seja
ele leigo ou já acostumado com o universo ficcional de Harry Potter: ele é o
“intruso” neste novo mundo fantástico diante de seus olhos. Apesar de não
compreender nada a respeito das criaturas, ou mesmo quanto à extensão do poder
bruxo oculto sob a cidade de Nova York, o simpático gordinho também mostra seu
valor em diversas situações: uma das cenas mais engraçadas envolve uma porta
resistente a feitiços capazes de destrancá-la; e o que o No-Maj faz? Ele simplesmente
arromba a porta com um chute!
É curioso notar como Jacob e Queenie agem de forma complementar não apenas para os protagonistas, como também entre eles. Apesar de abrupto, o leve romance entre os dois não chega a parecer forçado justamente pela ingenuidade de ambos, e pela química (ou seria alquimia?) entre eles: ambos gostam de cozinhar e preparar receitas envolvendo massas e doces, e devo dizer que o strudel feito por Queenie me deixou com fome...
É curioso notar como Jacob e Queenie agem de forma complementar não apenas para os protagonistas, como também entre eles. Apesar de abrupto, o leve romance entre os dois não chega a parecer forçado justamente pela ingenuidade de ambos, e pela química (ou seria alquimia?) entre eles: ambos gostam de cozinhar e preparar receitas envolvendo massas e doces, e devo dizer que o strudel feito por Queenie me deixou com fome...
3 – Um universo em clara e
bem-vinda expansão.
Eu não poderia falar desse filme sem destacar sua
produtora e escritora do roteiro: a própria J K Rowling! E ela está inspirada
em sua estreia, especialmente ao se tratar de uma trama totalmente inventada a
partir de um livro cuja função principal é de “nota de rodapé” para enriquecer
o universo dos bruxos e sequer possuía uma história propriamente dita,
limitando-se apenas a descrever os animais fantásticos e onde vivem.
Não deixa de ser agradável ver um universo tão
complexo se expandindo lentamente, saindo da Inglaterra rumo às Américas e
trazendo criaturas originárias de locais tão díspares quanto a África e a Austrália,
abrindo portas para mais possibilidades. E dessa vez Rowling conta com a
vantagem óbvia de começar uma nova saga utilizando o mesmo universo, e lançando
pistas referentes aos filmes e livros anteriores, retroalimentando uma
verdadeira mina de ouro escondida em sua imaginação. Só imagino que tipos de
monstros nós teríamos no Brasil, que já foi citado três vezes na saga
literária...
E falando nelas, como eu poderia deixar de fora as
criaturas? Temos marsupiais que gostam de objetos brilhantes, ao ponto de
esconder barras de ouro inteiras em sua bolsa; uma arraia voadora misturada com
borboleta; um leopardo venenoso com uma “juba” feita de espinhos; um pássaro
enorme que controla eletricidade... E esses são apenas alguns deles! O
deslumbramento com os monstros é tamanho que nem mesmo o viés levemente ecologista
chega a incomodar, com Newt berrando a plenos pulmões que “os animais fantásticos
não são perigosos, e sim os homens”...
4 – Um tema delicado.
Não é novidade que Rowling sempre teve apreço por
desenvolver temas típicos da passagem da infância à adolescência até a vida
adulta, bem como suas angústias, diversões e descobertas. Nesse novo filme
temos poucos personagens com menos de dezoito anos, então o foco se desloca
para o outro tema preferido da autora: discriminação e preconceito.
A importância de tal discussão é enfatizada ao se
levar em conta o país utilizado como cenário, cujas lutas em nome dos direitos
civis na década de sessenta por pouco não o levaram a conflitos mais
destrutivos, e também é o berço da Ku Klux Klan. Mesmo os filmes anteriores
tocavam nessa referência de forma explícita, afinal o uniforme dos servidores
de Voldemort, chamados de Comensais da Morte (“Death Eaters” no original), era
visivelmente baseado nos capuzes pontudos da Ku Klux Klan.
Um dos antagonistas nessa nova história é a líder de
um culto denominado como os Novos Salensianos, cuja maior influência está nos
julgamentos de Salem, em 1692. Desejosos de exterminar a “ameaça bruxa”, os
Novos Salensianos buscam apoio político com alguns candidatos a prefeito em
Nova York, além de espalharem panfletos e fazerem alertas por meio de grandes
discursos em público.
É possível que a concepção desses antagonistas seja
uma forma de vingança pessoal por parte de Rowling: quando o primeiro livro da
série Harry Potter foi lançado nos Estados Unidos, diversas igrejas e escolas se
opuseram à sua publicação, e até fizeram campanhas ferrenhas contra sua
divulgação em eventos literários. O argumento utilizado era de que os livros
claramente fomentavam o interesse em magia negra nas crianças, e que tal
matéria não deveria ser ensinada nas escolas (pois é...).
Pontos negativos:
1 – Lá e de volta outra vez.
Mesmo tendo um tema interessante para trabalhar na
história, isto não significa que sua exploração foi feita de forma adequada.
Enquanto ocorre a busca aos animais fantásticos de um lado, vemos as tensões
aflorando entre bruxos e No-Majs aparecendo lentamente, e a forma de exploração
desse elemento de enredo utilizou de uma técnica que nem sempre funciona bem,
nesse caso a divisão de personagens em núcleos.
Basicamente existem dois núcleos de personagens no
filme, sendo esses os bruxos e os No-Majs, e a passagem de cenas muitas vezes
ocorre de forma abrupta como se fosse uma bola de pingue-pongue indo de um lado
a outro. Algumas cenas chegam a durar pouco mais de um minuto, e então mais uma
vez estamos de volta à situação principal, sem mais nem menos, dando a
impressão que estamos vendo uma novela, e não um filme.
O problema da edição de cenas felizmente começa a cessar
a partir do último ato, mas aí surge outro problema: as batalhas nessa altura
do campeonato são confusas, envolvendo raios e sombras voando loucamente de um
lado para outro. Contribui para a confusão de imagens o fato de uma das
criaturas mais perigosas do filme simplesmente não possuir forma definida, e
seus poderes são destrutivos o bastante para destruir boa parte do cenário, só
aumentando a confusão visual.
2 – Cinquenta tons de negro.
Um detalhe interessante salta aos olhos de quem
assiste Animais Fantásticos e onde habitam pela primeira vez: quando a trama
decide mostrar o núcleo dos No-Majs, os cenários e figurinos ficam escuros. Na
verdade, até mesmo o tom da história se torna sombrio e mórbido, como se
subitamente o filme tivesse deixado de ser uma aventura para se tornar um filme
de terror, afinal nem mesmo as crianças malignas ficaram de fora.
É possível que tal escuridão tenha sido escolha da
própria direção, em uma tentativa de diferenciar os dois núcleos da história,
mas no fim essa estranha medida mais atrapalha do que propriamente ajuda na
compreensão do que está acontecendo: em algumas cenas só é possível ver os
atores e suas ações por meio de silhuetas, graças à luz passando em corredores
estreitos. Como se isso não bastasse, os figurinos pretos apenas atrapalham a
visão.
Se você gostou deste texto, confira outros textos escritos pelo Mateus:
1) A Tragédia do Rei Gelado
2) O Trovadorismo
3) Os Maiores Aventureiros da Literatura
4) 10 Maiores Vilões da Disney
5) 10 Maiores Heróis da Disney
6) 10 Melhores Princesas da Disney
7) Os Melhores Contos de Grimm - Análise
8) Duncan Garibaldi e a Ordem dos Bandeirantes - Análise
*Confira também a TAG (marcador ao lado direito do blog) Mateus Ernani Heinzmann Bulow.
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